São Paulo, sábado, 19 de maio de 2001

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CRÍTICA

Escritor desce do Olimpo

DA REPORTAGEM LOCAL

Puxado pelas mãos apaixonadas e ao mesmo tempo decepcionadas do cubano Leonardo Padura Fuentes, Ernest Hemingway desce do Olimpo da literatura para se misturar a nós, mortais, em "Adeus Hemingway".
Não é o ícone de toda uma geração de escritores que se vê aí; é um homem no final da vida, à beira do colapso, despedaçado pelo próprio mito. Irá se matar logo, isso sabemos. Poderá ter matado, e isso ainda não sabemos.
O Hemingway de Padura é, para usar um desses pejorativos tão ao gosto dos norte-americanos, um "loser" (perdedor). Viveu incríveis aventuras, teve muitas mulheres, caçou feras na África, escreveu livros geniais -por que um homem como esse poderia se considerar um perdedor?
Porque, imagina o detetive Mario Conde, vivia "à sombra de uma fama equivocada e fútil, mais apropriada a uma vedete da violência em eterno safári do que a um homem dedicado a lutar contra um inimigo tão obstinado e imune às balas como são as palavras". Resumindo: um "loser".
O detetive Conde, afastado da polícia havia já oito anos, é convocado para o caso pelo investigador Manuel Palacios, seu amigo Manolo, porque este conhecia seu interesse pelo escritor norte-americano, que viveu em Cuba largas temporadas entre os anos 30 e 50.
No quintal do sítio Vigía, onde Hemingway morava e hoje transformado em museu, havia aparecido um cadáver. Perto dele, um distintivo do FBI. Como o escritor estava sendo investigado pelo governo de seu país naquela época, a suspeita parece óbvia. Resta a Conde esclarecer se o escritor que caçava era capaz de matar também humanos.
É tudo ficção, mas Padura Fuentes aproveita para contrabalançar, em relatos paralelos -um, de Conde; outro, de Hemingway-, os argumentos favoráveis e contrários ao autor norte-americano, Nobel de 1954. A seu favor, relatos e romances ainda hoje apaixonantes; contra, acessos de mau-caratismo que o fizeram tripudiar de grandes amigos.
No final, duas conclusões: Hemingway é genial, e o livro, também. Particularmente divertida é a história da calcinha preta de Ava Gardner envolvendo uma pistola do velho "Papa", ou a estupefação que causa no escritor a narrativa de J.D. Salinger, o autor de "O Apanhador no Campo de Centeio": uma "novela absurda e disparatada", resmunga.
(CYNARA MENEZES)


Adeus Hemingway
    
Autor: Leonardo Padura Fuentes
Tradutora: Lúcia Maria Goulart Jahn
Editora: Companhia das Letras
Quanto: R$ 21 (178 págs.)




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