São Paulo, segunda-feira, 19 de junho de 2006

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Gordo diz que segue "retardado, mas responsável"

Em fase "família", líder do Ratos de Porão lança programa de entrevistas e se considera a "Angélica do inferno"

Apresentador critica a MTV, emissora onde trabalha, e afirma odiar tudo aquilo que há de novo no cenário da música pop mundial

LUCAS NEVES
DA REPORTAGEM LOCAL

"Eu era um gordo maluco que só cheirava. Minha vida mudou muito. Hoje em dia, tudo que tenho que fazer pelos meus filhos, de trocar fralda a assistir 6.000 vezes a "Branca de Neve" ou "Bob Esponja", eu curto. Sei todas as músicas de "Cocoricó" de cor." O autor do relato acima é o marido de Viviane e pai de Victoria e Pietro, João Francisco Benedam, o João Gordo da MTV e dos vocais furiosos do Ratos de Porão em horário comercial.
Em busca de, nas palavras do próprio, "menos insanidade e demência", o quarentão acaba de estrear um programa no canal de música. Em "Gordo Visita", ele vai à casa de uma personalidade, bisbilhota álbuns de família e objetos pessoais, e conversa, entre outros assuntos, sobre carreira, dinheiro e sexo. "Tirei a idéia do Amaury Jr.", ironiza. A relação de anfitriões é heterogênea: já soaram as campainhas da ex-BBB Sabrina Sato (edição que vai ao ar hoje à noite, às 22h), dos cantores Ronnie Von e Zeca Pagodinho e do boxeador Popó. Mas há quem recuse o convite para abrir as portas de casa a Gordo e sua equipe. "Ficam com medo, acham que eu vou vomitar na pia."
O apresentador é a única semelhança que a nova atração guarda com o programa "Gordo Freak Show", o circo de bizarrices em cujo picadeiro se revezam gincanas e shows de calouros insólitos.
"Achei que estava muito extremo no "Freak", xingando o espectador. Aproveitando a minha facilidade para a conversa espontânea, propus o "Visita'", diz Gordo. Aos que possam ver no formato um precedente à caretice e ao bom mocismo, ele tranqüiliza. "Continuo o mesmo retardado de sempre, mas com responsabilidade."

"Angélica do inferno"
O conceito do programa recém-estreado lembra o de "Estrelas", que Angélica comanda aos sábados na TV Globo. Ela também visita famosos em busca de histórias e hábitos prosaicos. Mas Gordo logo afasta qualquer parentesco entre as atrações e seus cicerones. "Sou a Angélica do inferno."
A morada do belzebu, pelo visto, é ambiente inóspito para a televisão. Nem a MTV tem vez. "Nunca gostei da programação do canal. Se dependesse de mim, passava [o desenho] Speed Racer e tocava grindcore [uma variação acelerada de hardcore] o dia inteiro." Ainda assim, Gordo pondera que a emissora é a única a dedicar faixas do horário nobre ao som underground.
No toca-CD do apresentador e músico, o repertório varia de acordo com a ocasião: se ele está montando o set list de uma noite de discotecagem, o critério de seleção é "de 1987 para baixo", o que torna elegíveis de Deep Purple a Elton John. "Já em casa, só ouço barulheira." No novo rock europeu (Franz Ferdinand, Kaiser Chiefs, Arctic Monkeys), não há nada interessante? "Odeio tudo que é novo. É uma revisita àquilo que já era ruim no original."
Revisitar o incidente com o ator Dado Dolabella, em 2003, durante uma gravação do "Gordo a Go-Go", também não lhe agrada muito. Na ocasião, uma troca de insultos e a quebra de uma mesa por Dolabella quase descambaram para a agressão física. Três anos depois, no entanto, ele encara o episódio de maneira mais descontraída. "A fita do programa tinha que ser divulgada na internet. Ia bombar no YouTube [site que oferece vídeos de erros de gravação e momentos inusitados de programas de TV]."
Trocando o condicional pelo concreto, Gordo diz já ter planos para quando a idade apontar para a aposentadoria televisiva e fizer o sangue metaleiro esfriar. "Terminar o segundo grau e cursar história. O que eu uso é o que aprendi na rua, porque virei punk e não queria saber de estudar." Ele garante que não vai se incomodar caso a sua prole não tenha herdado o DNA hardcore do pai. "Se meus filhos quiserem ser crentes ou pagodeiros, quem sou eu para impedir?"


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