São Paulo, quinta-feira, 19 de julho de 2007

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A saga do tomate

Oferta de variedades aumenta, mas tomate ainda tem qualidade irregular, com frutos insípidos, duros e pálidos

JANAINA FIDALGO
DA REPORTAGEM LOCAL

A interrogação que martela a cabeça de quem gosta de cozinhar (e de comer) é a mesma que levou anos atrás o italiano Sauro Scarabotta, chef do Friccó, a campo: por que é tão difícil encontrar tomates de boa qualidade no Brasil?
À época, ele visitou uma estação experimental de tomates em Paulínia (no interior de São Paulo), andou pela plantação e provou mais de 40 frutos. Voltou com o bagageiro do carro lotado e fez uma pilha de tomates na entrada do restaurante. Ao oferecê-los aos clientes, ouviu de muitos: "Não, eu não gosto de tomate".
"É claro, só tinham comido tomate ruim", diz Scarabotta, que cresceu vendo a avó e a mãe cultivarem o fruto para consumo próprio. "Procurei muito porque achava uma pena um país com um clima tão bom não ter um tomate gostoso."
O tão almejado sabor deste fruto oriundo da região andina vem do equilíbrio de açúcares e ácidos orgânicos, componentes que correspondem a 5% do tomate -95% é água.
Pouco ácido e pouco açúcar dão origem aos frutos insípidos que pululam as prateleiras. Por outro lado, a oferta de variedades diferentes aos poucos tem aumentado. É possível encontrar tomates muito saborosos, como o momotaro, mas a preços nem sempre atraentes (leia mais à esquerda).
No Pomodori, onde o tomate aparece não só no nome do restaurante (está presente até em um sorvete), exemplares de qualidade duvidosa não são mais um problema.
"Achamos fazendas que nos fornecem um tomate extremamente vermelho, firme e doce, que chegou ao máximo da maturação no pé", diz Rodrigo Martins, chef do restaurante. "Pagamos mais caro que na feira, mas não sofremos com os altos e baixos, principalmente quando chove, e, para evitar as pragas, o produtor acaba colhendo o fruto mais cedo."

Longa vida, gosto limitado
"Se você tem de transportar tomate nas condições péssimas que nós temos no Brasil, com as condições de produção que nós temos, o tomate chega ao destino ketchup, porque o fruto não tem estrutura", diz Paulo César Tavares de Melo, professor doutor do departamento de produção vegetal da Esalq-USP e presidente da Associação Brasileira de Horticultura.
Ocorre que nas últimas décadas muitas variedades passaram por melhorias genéticas para selecionar frutos menos perecíveis, com vida útil maior. O resultado é o chamado tomate "longa vida" (comercialmente conhecido como Carmen), que amenizou os problemas de produção e distribuição, mas, em contrapartida, criou outro para o consumidor: um fruto rijo, com pouco gosto e pálido.
"No final dos anos 70, Israel identificou os chamados retardadores de maturação, que ampliam a vida de prateleira do tomate", diz Melo. "Mas, quando esse interruptor é desativado, prejudica-se o desenvolvimento dos componentes que dão sabor e aroma ao fruto."
O outro tipo de longa vida disponível no mercado, o estrutural do tipo Santa Cruz (ou Débora), foi selecionado para ter paredes grossas. Tem mais celulose e pectina, substâncias que o tornam firmes e ampliam sua durabilidade, sem prejudicar tanto o sabor.
"O tomate longa vida realmente consegue ampliar a vida de prateleira de um produto que é muito perecível. Acontece que, se o tomate longa vida, como em alguns países da Europa, é deixado na planta até um estágio avançado de maturação, há um dano menor em relação a suas qualidades gustativas, mas isto não acontece no Brasil. Eles são colhidos verdes", diz o professor.
"Tomate se compra o ano todo porque o Brasil é um país tropical. E, a rigor, não precisaria nem ter tomate longa vida. Para que ter 20 dias de vida em prateleira se há uma estatística mostrando que a dona-de-casa vai ao supermercado duas vezes por semana? O tomate não precisa durar 15 dias."


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