São Paulo, terça, 19 de agosto de 1997.



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TERRA BRASILIS
Personalidades descobrem o Brasil na TV

CRISTIANA COUTO
especial para a Folha

O brasileiro precisa redescobrir o Brasil. Essa idéia, retirada do livro "O Turista Aprendiz", do escritor Mário de Andrade, deu início a uma viagem pelo país sob o olhar de artistas plásticos, cineastas, músicos, atores e poetas.
No dia 31, às 20h, a TV Cultura estréia "Expresso Brasil", uma série de 27 documentários sobre cada Estado do país.
Minas Gerais, apresentado por Ziraldo, é o primeiro episódio. Cada personalidade é o narrador de sua terra natal, que retrata sob um ponto de vista peculiar. Ela percorre vários pontos, como um "repórter" da história e das memórias de infância, analisando a arquitetura e as artes, e mostrando a cultura local pela culinária, literatura e música, sempre interagindo com brasileiros anônimos.
O Rio de Janeiro da atriz e cineasta Carla Camurati não tem carnaval nem mulheres de biquíni. É a cidade geográfica das montanhas de Teresópolis, do Corcovado, dos filmes de Arnaldo Jabor e Hugo Carvana.
"Na série, a cidade não se esgota, pois não traz uma imagem única do lugar", diz Carla.
A leitura subjetiva de cada Estado foi, na opinião de Jorge da Cunha Lima, presidente da Fundação Padre Anchieta, uma das razões que levou a TV Cultura a fazer parceria com a Polo de Imagem, idealizadora do "Expresso Brasil". "Transparece um amor sem ser ufanista", diz.
As outras foram a magnitude do projeto e o fato de a produtora ser de Recife (ver texto ao lado). "A idéia é descobrir o Brasil pelos olhos de personalidades culturais", diz Roberto Viana, diretor-executivo da série.
São Paulo é a cidade multicultural do poeta Haroldo de Campos. Ele levou a equipe a um templo de ouro japonês na cidade de Itapecerica da Serra, ao mosteiro de São Bento, ao Terraço Itália, ao estúdio do compositor Arnaldo Antunes. "São Paulo nasceu sob o signo do multilinguismo", avalia. Dos 14 programas já produzidos, com meia hora cada, nove mostram os Estados do Norte e Nordeste do Brasil, partindo das capitais e, às vezes, de outras cidades.
São Luís (MA) do poeta Ferreira Gullar é envolta em lendas e histórias reais curiosas, como um processo judicial contra as formigas. Gullar caminha por túneis subterrâneos, inspeciona igrejas e declama parte de seu "Poema Sujo" (1975) nas escadarias da antiga ladeira do comércio.
A arte popular conduz a Recife (PE) do músico, bailarino e ator Antônio Nóbrega. São cantadores, tocadores de rabeca, a festa do frevo e do maracatu e a cidade de Olinda, que "parou no tempo".
O escritor Márcio Souza sintetiza sua "releitura tropical da cultura européia" em Manaus. "Até 1823, a Amazônia era dividida em duas colônias", diz no programa, enquanto mostra a estética cubista das redes e o Teatro Amazonas.
A paulista Niéde Guidon, antropóloga, foi a única que não nasceu no Estado de que fala. Desde 1970, ela estuda o maior sítio arqueológico das Américas, o Parque Nacional da Capivara, no Piauí, e o usa como ponto de partida em uma viagem pré-histórica. "Nosso homem mais antigo apareceu lá, há 48.700 anos."
"O critério na escolha das personalidades era o de identidade com a terra", diz o jornalista Gabriel Priolli, supervisor-geral da série.
É na aldeia Deminin, ao sul de Roraima, que o índio ianomami Davi Kopenawa mostra o abismo entre o resto do Brasil e sua comunidade, quase inalterada.
O envolvimento dos entrevistados foi elogiado pela equipe. O cineasta Jorge Furtado a levou ao Mercado Público de Porto Alegre (RS) entre suas filmagens, e há nove fitas só com a narrativa de Haroldo de Campos.
A única que não foi às ruas foi Daniela Mercury, por causa da agenda lotada. "Ficou um programa com densidade plástica forte, calcado no povo de Salvador", diz Helder Aragão, um dos diretores do "Expresso Brasil". "Como é difícil viajar, será ótimo conhecer o Brasil mais distante e profundo pela TV", diz Guidon.




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