São Paulo, sábado, 19 de outubro de 2002

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"O ESCÂNDALO POLÍTICO"

Caso Clinton/Lewinsky motivou John B. Thompson

Sociólogo aborda fenômeno que abala vidas públicas

CARLOS EDUARDO LINS DA SILVA
ESPECIAL PARA A FOLHA

Escândalos políticos não chegam a ser novidade em lugar nenhum do mundo. Mas eles nunca tiveram tanta visibilidade como nos últimos 20 anos. Não há melhor exemplo do que o caso Bill Clinton/Monica Lewinsky, que ocupou a imaginação de bilhões de pessoas durante meses no final da década de 90.
Foi esse episódio que motivou o sociólogo britânico John B. Thompson, professor da Universidade de Cambridge, a escrever "O Escândalo Político", que na edição brasileira tem um interessante e oportuno prefácio em que o tradutor, o psicólogo Pedrinho Guareschi, tenta fazer aplicações das teorias de Thompson ao país.
Thompson classifica os escândalos em sexual, financeiro e de poder. Todos são políticos porque a enorme exposição que lhes é dada, quando envolve ocupantes de cargos públicos, tem implicações claras no desempenho do governo e no processo eleitoral, como o caso Lewinsky demonstrou.
Diversos presidentes americanos antes de Clinton tiveram casos extraconjugais sem que a opinião pública, que os desconhecia, se importasse. O que singularizou o episódio Clinton foi o fato de que ele se tornou absolutamente público. Ademais, diz Thompson, os escândalos políticos envolvem o comportamento de pessoas consideradas exemplares em assuntos fundamentais de moralidade social. Por isso, eles se tornam centrais no debate coletivo.
Thompson tem, como muitos intelectuais críticos, a tendência de exagerar o papel dos meios de comunicação de massa na sociedade contemporânea. Deixa de lado outras variáveis importantes, o que simplifica demais a análise.
Por exemplo: o presidente François Mitterand também tinha uma amante, tão reconhecida do público que até foi ao seu enterro, mas a França nunca deu muita bola ao caso, embora ele não fosse secreto. Talvez por a França não ter passado por uma experiência puritana tão intensa como a dos EUA, esse tipo de incidente não se torna um escândalo político.
Thompson conclui que "a cultura do escândalo político dificilmente facilitará a tarefa de criar uma forma de democracia mais forte e inclusiva". Felizmente, da conclusão ele não extrai nenhuma receita autoritária como frequentemente alguns de seus colegas sugerem, como a instituição de práticas de controle público sobre o conteúdo jornalístico divulgado pelos meios de comunicação.
Ao contrário, o autor chega até a realçar aspectos positivos do fenômeno do qual é crítico, resultantes da reflexão coletiva que esses assuntos provocam. Os americanos, no episódio Clinton/Lewinsky, por exemplo, foram obrigados a rever seu puritanismo e o colocaram, na hierarquia dos valores comuns da nação, abaixo do pragmatismo, já que absolveram o presidente devido ao seu bom desempenho administrativo.
Mesmo quem não concorda com as conclusões de Thompson haverá de reconhecer o alto grau de sofisticação intelectual de seu trabalho. O tema, relevante, é tratado com uma abordagem metodológica séria, documentação farta e detalhada (ainda que praticamente limitada ao universo anglo-americano) e originalidade.
Além de tudo, com estilo que, se não chega a ser atraente, ao menos não incorre no "sociologuês" que com frequência afasta leitores leigos de idéias instigantes. Não foi à toa, nem imerecidamente, que esse livro conquistou alguns dos mais importantes prêmios das ciências sociais no mundo.

Carlos Eduardo Lins da Silva é diretor-adjunto de Redação do jornal "Valor"

O Escândalo Político


   
Autor: John B. Thompson
Editora: Vozes
Quanto: R$ 38 (328 págs.)




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