São Paulo, sábado, 19 de outubro de 2002

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"O DEMOLIDOR DE PRESIDENTES"

Historiadora traça retrato psicológico de Carlos Lacerda

GILBERTO FELISBERTO VASCONCELLOS
ESPECIAL PARA A FOLHA

Este é o melhor livro sobre Carlos Lacerda (1914-1977), o jornalista e político que derrubou Getúlio Vargas (54) e Jango (64).
A historiadora Marina Gusmão traça um retrato psicológico de quem investe contra todos os rivais, a começar por seu pai, Maurício Lacerda, que era comunista e com quem brigou no episódio da separação de sua mãe.
Depois veio a birra com Luis Carlos Prestes. Sua desavença passional com Vargas só começou em 1943, que se segue no pós-morte, atribuindo um caráter apócrifo à "Carta Testamento" de 1954; mas o ressentimento maior de Carlos Lacerda foi ter sido expulso do Partido Comunista Brasileiro em 1939, com a pecha de traidor, delator e falsário.
Detalhe: o nome Carlos Frederico de Lacerda, homenagem feita pelo seu pai, é a mistura de Karl Marx com Friederich Engels. Com a saída traumática do partidão, ficou sem trânsito no meio da intelectualidade de esquerda, sendo até expulso da casa de Álvaro Moreira e Eugênia Moreira.
A tese de Marina Gusmão, retomando a abordagem psicanalítica de Gondin da Fonseca, é que Lacerda encarou o partidão como mãe que o rejeitou. Vargas foi seu pai projetado como demônio.
Julgando-se vítima, Lacerda não perdoou a aliança do partidão com Vargas, isto é, o Prestes "queremista". Isso tudo em meio à automistificação de homem providencial, herói, mártir, cuja obsessão era ser presidente da República. Pela via do golpe. Aliás, o golpismo é o que define a sua personalidade política.
É famosa a formulação dele sobre o retorno de Vargas: "O sr. Getúlio Vargas senador não deve ser candidato à Presidência. Candidato, não deve ser eleito. Eleito, não deve tomar posse. Empossado, devemos recorrer à revolução para impedi-lo de governar".
Lacerda tinha tesão no golpe de Estado. Na década de 40 brigou com o poeta Jorge de Lima, com o pintor Portinari, com o jornalista Samuel Wainer. Na década de 40 se aproximou dos EUA, difamou o cineasta Orson Welles, se indispôs com Ary Barroso, foi contra a construção do estádio Maracanã, fundou o jornal "A Tribuna da Imprensa" bancado pela Standart Oil para atacar o nacionalismo e a criação da Petrobras.
Detratou o Iseb (Instituto Superior de Estudos Brasileiros), em ideólogo do capital estrangeiro e das oligarquias rurais. Governador do Rio, recebeu ajuda financeira oriunda da Aliança para o Progresso, ganhou o apodo de "meta-mendigos" e em 64, sintonizado com a CIA, derrubou João Goulart sobre quem dizia que era "dono de um cabaré em São Borja" e explorador de prostituta. Acabou cassado pelos militares. Morreu desiludido. Não chegou à Presidência da República.

Gilberto Felisberto Vasconcellos é professor de ciências sociais da Universidade Federal de Juiz de Fora (MG) e autor de "Glauber Pátria Rocha Livre" (Senac), entre outros

O Demolidor de Presidentes


    
Autor: Marina Gusmão de Mendonça
Editora: Codex
Quanto: R$ 39 (384 págs.)


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