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DRAUZIO VARELLA
A longevidade do sexo frágil
Nós, do chamado sexo forte,
morremos bem mais cedo
do que as mulheres. A explicação
tradicional para essa constatação
demográfica tem sido a de que levamos vidas mais atribuladas e
cheias de riscos do que elas. Afinal, em nossa história evolutiva,
nós é que saíamos atrás da caça e
declarávamos guerra aos inimigos para roubar-lhes os pertences
e o território, enquanto elas permaneciam no aconchego das cavernas tomando conta dos filhos
que trazíamos ao mundo.
O maior apego feminino à prole
também costuma ser usado como
justificativa evolucionista para o
ganho de longevidade delas. No
passado, levaram vantagem na
seleção natural não apenas as
mães que cuidaram bem de seus
filhos, mas especialmente as que
viveram mais tempo, entraram
em menopausa e puderam ajudar na criação dos netos. Essas
mulheres de vida mais longa teriam deixado mais descendentes,
garantindo maior penetração de
seus genes no "pool" genético das
gerações futuras.
Embora avós carinhosas aumentem as chances de sobrevivência dos netos e os dados estatísticos mostrem que os homens
têm maior probabilidade de morrer em desastres automobilísticos,
em homicídios e em acidentes
com armas de fogo, esses eventos
não constituem explicação definitiva para a diferença de longevidade entre os dois sexos.
A frequência de homicídios e de
acidentes fatais começa a aumentar significativamente entre os
homens a partir da puberdade, de
fato, mas diminui a partir dos 30
ou 40 anos para se tornar praticamente igual à das mulheres depois dos 60 anos. Mesmo depois
dessa idade, entretanto, continuamos a morrer mais cedo do
que elas.
Sarah Moore e Kenneth Wilson,
da Universidade de Stirling, na
Inglaterra, acabam de publicar
um estudo na revista "Science"
que acende outras luzes sobre o
tema.
Depois de estudar a incidência
de infestações por insetos, parasitas e doenças infecciosas em diversas espécies de mamíferos, os
autores concluíram que, nos animais estudados, os machos apresentam maior suscetibilidade a
doenças infecciosas e parasitárias
do que as fêmeas.
E, mais, que tal suscetibilidade é
consequência do dimorfismo sexual, isto é, do tamanho avantajado que os machos costumam
atingir em relação às fêmeas na
maioria das espécies dos animais
que, como nós, mamam quando
filhotes.
Na evolução das espécies, o dimorfismo sexual existente entre
machos grandes e fêmeas de tamanho menor é indicativo de intensa disputa masculina pelo privilégio do acasalamento no passado. A explicação é simples: nos
combates intra-sexuais, para
atrair a atenção feminina, os machos mais fortes levaram vantagem seletiva e transmitiram a
seus filhos genes que lhes garantiram portes avantajados. As fêmeas, por sua vez, sempre interessadas nos machos mais poderosos, capazes de lhes garantir a sobrevivência da prole, contribuíram decisivamente para a perpetuação dessa característica masculina.
Os dados obtidos por Moore e
Wilson demonstraram que a
maior fragilidade dos machos
diante dos parasitas é regra geral
entre os mamíferos e que ela adquire proporções extremas nas espécies em que a competição intra-sexual na disputa pelas fêmeas é
mais feroz.
Os dados demográficos humanos dão suporte às conclusões dos
pesquisadores ingleses. No Japão,
na Inglaterra e nos Estados Unidos, a vulnerabilidade dos homens à morte, causada por doenças parasitárias, é o dobro daquela encontrada nas mulheres. Um
estudo conduzido no Cazaquistão e no Azerbaijão mostrou que,
nesses países, essa proporção aumenta para quatro vezes.
A explicação mais imediata para a fragilidade do sexo forte em
relação aos agentes parasitários e
infecciosos é a de que a testosterona, o hormônio sexual masculino,
provoca depressão imunológica.
Um trabalho clássico, publicado
há mais de 30 anos, mostrou que
os homens castrados vivem em
média 15 anos mais do que os
não-castrados e que, quanto mais
precoces forem quando sofrerem
a castração, maior será a sua longevidade.
O mecanismo pelo qual a testosterona deprime a imunidade é
mal conhecido. Talvez por gastarem energia em excesso para
construir e manter um sistema
músculo-esquelético que imponha respeito aos rivais, os machos
sejam obrigados a desviar a energia que seria utilizada por outros
sistemas orgânicos. Com seus bilhões de células que exigem alta
demanda energética para trabalhar orquestradamente, o sistema
imunológico pode se ressentir dessa oferta diminuída e da disponibilidade de micronutrientes essenciais.
A espécie humana apresenta
evidente dimorfismo sexual. A
testosterona que começou a jorrar
na circulação de nossos ancestrais
à época da puberdade deles tornou-os mais fortes e violentos para competir pelo interesse feminino, sempre voltado à preservação
da prole. A energia consumida
pelo organismo para torná-los
maiores e assegurar a transmissão de seus genes às gerações que
os sucederam faz falta até hoje
para enfrentarmos míseros parasitas microscópicos.
Por ironia das forças naturais
que selecionaram os genes de nossos antepassados, continuamos
maiores e fadados a morrer mais
cedo do que nossas mulheres,
mesmo agora, quando a maioria
delas já perdeu o interesse pela
força bruta.
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