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CRÍTICA/TEATRO
Espetáculo encenado no rio Tietê sofre com diálogos abafados, roteiro disperso e relações de causa e efeito
"BR-3" decepciona por limitações técnicas
SERGIO SALVIA COELHO
CRÍTICO DA FOLHA
A decepção que a mais nova
aventura do Teatro da Vertigem suscita vem da grande expectativa que ela gerava. Depois da
"Trilogia Bíblica", na qual igrejas,
hospitais e presídios se transformavam de cidade em cidade em
focos de questionamento social e
urbano, bem além dos temas religiosos que serviam de ponto de
partida para as peças, o grupo
anunciou investida mais ousada.
A aposta era percorrer três cidades emblemáticas do Brasil que
contêm o BR no nome, estabelecendo o ponto de contato entre a
capital Brasília, a Brasilândia da
periferia paulista e Brasiléia, na
fronteira com a Bolívia. Durante
33 dias, foi possível acompanhar
em um diário de viagem na Folha
Online os relatos do coordenador
teórico do projeto, Ivan Delmanto. Ficou documentado um Brasil
entre o grotesco e o sublime.
O material riquíssimo teve de
encontrar seu local-síntese, e o rio
Tietê foi a escolha mais certa.
Além da referência ao rio como
meio de transporte arquetípico, a
excursão pelos intestinos podres
da cidade revela seu arrojo arquitetônico invisível, um futuro jogado no lixão, que possibilita um vigoroso reencontro com a utopia.
No entanto, os desafios técnicos
da empreitada acabaram limitando muito seus resultados. Releve-se aqui o mau cheiro que acompanha o público. Afinal, compartilhar o desconforto sempre foi a
missão artística do Vertigem.
No entanto, a poluição sonora
do barco, mesmo que integrada
pela trilha sonora inicial, obriga
os atores nas margens a se dublarem, e os diálogos chegam abafados, por alto-falantes, o que dispersa em mancha de óleo o grande carisma de atores como Roberto Audio e Cácia Goulart e ainda
mais os esforços de jovens atores.
Como sempre, imagens de
grande impacto honram o nome
do grupo. Os figurinos kitsch de
Marina Reis e a competente direção de arte de Márcio Medina fazem um panorama do imaginário
brasileiro, nem sempre fugindo
do folclórico, como na cena do ritual da huasca, mas instigando
com uma estética de "trem fantasma", um espetáculo de som e luz
de um esgoto a céu aberto.
No entanto, o roteiro confuso
de Bernardo Carvalho, disperso
em alusões rápidas demais, e uma
trama com uma insistência demasiada em relações de causa e
efeito desnorteiam. Jovelina, grávida de Jonas, busca o pai da
criança, que ergueu Brasília; Jonas, por sua vez, será procurado
pelos filhos nos confins do Acre.
Uma narrativa de enigma envolvendo seitas e tráfico se sobrepõe
desnecessariamente ao que foi
visto em viagem. O tema se dilui.
Resta a sensação de aventura, de
transgressão urbana, que é a característica do Teatro da Vertigem, mas não seu essencial. "BR-3", concebido para ser a mais radical superação do grupo, vira
obra menor do seu repertório.
BR-3
Quando: qui. a dom., às 21h; até junho
Onde: no rio Tietê, SP; ponto de
encontro para o público é o
estacionamento do Memorial da
América Latina, na Barra Funda (av. Auro
Soares de Moura Andrade, portão 8).
Dois ônibus levarão os espectadores até
o local de embarque
Quanto: R$ 40, nas lojas da Fnac
Pinheiros (pça. dos Omaguás, 34, SP) e
Fnac Paulista (av. Paulista, 901, SP), de
ter. a dom., das 10h às 22h. Mais
informações pelo tel. 0/xx/11/3115-0345
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