São Paulo, sexta-feira, 20 de abril de 2007

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Cinema/estréias

"Chega de verdade pela metade", diz Ratton

Diretor de "Batismo de Sangue" vê "pacto de silêncio" sobre a tortura no Brasil

Estréia hoje em seis capitais brasileiras o longa baseado em livro homônimo de Frei Betto, que deu a Helvécio Ratton o troféu Candango


SILVANA ARANTES
DA REPORTAGEM LOCAL

O longa "Batismo de Sangue", de Helvécio Ratton, que estréia hoje em seis capitais brasileiras, é baseado no livro homônimo de Frei Betto.
Portanto, "tem a tortura como um personagem central", observa o diretor, já que o filme narra o apoio de frades dominicanos a grupos de esquerda que lutavam contra a ditadura militar brasileira dos 60 e, sobretudo, os efeitos da prisão e tortura em Frei Tito (Caio Blat), que se suicidou na França, em 1974, aos 29 anos, sofrendo de visões persecutórias.
Quando "Batismo de Sangue" deu a Ratton o troféu Candango de melhor diretor, no Festival de Brasília, no ano passado, Frei Betto referendou o filme e a iniciativa de abordar os anos de chumbo no cinema.
"Não queremos vingança, mas esquecer seria injusto", afirmou o religioso. Ratton, que viveu exilado no Chile durante a ditadura militar, diz que "o revanchismo" tampouco é sua meta com o filme, mas acredita que "se estabeleceu no Brasil um pacto de silêncio em relação à tortura".
O diretor pretendeu romper esse pacto, filmando com intenso realismo as cenas de tortura que terminaram por arrancar dos frades a informação que levou ao assassinato, em 1969, do líder guerrilheiro Carlos Marighella (Marku Ribas) pelo delegado Fleury (Cassio Gabus Mendes) e sua equipe.
"Tito foi quebrado pela tortura. Mostrar isso com meias-verdades seria de um cinismo enorme, em nome não sei de quê, a não ser esse pacto do silêncio. Chega de meias-verdades. Vamos às verdades inteiras", afirma o diretor.

Tortura
A representação da tortura por Ratton em "Batismo de Sangue" tem sido um aspecto questionado pela crítica -a da Folha inclusive- que enxerga nela certa intenção sádica do cineasta.
Ratton diz se espantar com o fato de que a mesma atenção da crítica brasileira não se volte para "[O blockbuster norte-americano] "300" [de Zack Snyder], em que a violência é muito mais explícita e brutal".
"300", em cartaz no Brasil, trata da batalha de Termópilas, em que soldados espartanos enfrentam o exército persa.
Para o diretor, no entanto, há uma explicação para o incômodo que a abordagem da tortura em seu filme provoca. "Acho que o que dói em "Batismo de Sangue" é que aquilo aconteceu realmente e há muito pouco tempo. Foi ontem, em relação ao tempo histórico. Os personagens dessa história ainda estão vivos", afirma.
Mas não é só a barbárie que "Batismo de Sangue" encena. Numa reconstituída carceragem do DOPs que existiu em São Paulo, os frades presos rezam uma missa em que o vinho é substituído por Q-Suco de uva e a hóstia, por bolachas Maria.
"Acho que essa cena passa a idéia da resistência, não a física, mas aquela que possibilita emergir de um momento de desespero", avalia o diretor, que prepara novo longa com "um pouco de leveza, para compensar a densidade".


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