São Paulo, domingo, 20 de abril de 2008

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Mônica Bergamo

bergamo@folhasp.com.br

Marlene Bergamo/Folha Imagem
Renata de Moraes: "Copeira impecável servindo capuccino" e ambiente "cozy"


Daslu, 50

Com meio século de existência e dois anos depois de uma crise em que a dona da loja chegou a ser presa, a butique Daslu permanece como referência para "todas as meninas" de alta renda de São Paulo

Em meio a flutes de champanhe Veuve Clicquot e casaco de pele em mãos, Fabiana Pastore, a Fá, 31, assistiu, na terça passada, a mais um dos desfiles de importados da Daslu. Mais um, porque ela já perdeu a conta de quantos viu -além de cliente "desde a Vila Nova [Conceição, bairro em que a Daslu funcionava até 2005]", trabalhou dez anos na loja. A chegada de Dolce & Gabbana, Prada, Saint-Laurent, Gucci e Chanel às prateleiras da loja, na década passada, são "momentos marcantes na vida" de Fá. "Nossa, a Daslu é tããoo importante na minha vida! Lá aprendi a me relacionar. Lá eu me diverti, lá eu chorei, lá eu me casei, lá eu vi minhas filhas nascerem...".

 

No dia seguinte, Fá vai à casa da amiga Patrícia Abdalla, 24, na rua Holanda. Cinco câmeras registram a entrada das visitas. Dentro, obras de Vik Muniz e Calder. Nos closets, peças como uma (bolsa) Birkin, da Hermès -de cerca de US$ 8.000-, e botas Sérgio Rossi. Patty conta: "Eu era muito nova quando entrei na Daslu. Lembro de, aos 7 anos, ir com minha mãe. Eu já conhecia a tia Eliana [Tranchesi, dona da butique]. Era uma casa pra gente, não uma loja. Estava na programação da família: "Patty, amanhã é seu dia de ir com a mamãe na Daslu!'".
 

A butique, fundada por Lourdes Aranha dos Santos e Lucia, mãe de Eliana Tranchesi, está completando 50 anos. A data está mobilizando as clientes, que prestigiam desfiles, lançamentos e exposições. Segundo Eliana, a maior parte delas têm entre 20 e 40 anos. Ela não revela gastos das clientes. Estima-se que a renda média esteja no patamar de R$ 70 mil/mês. Consumidoras vips comprariam R$ 400 mil por ano. Há o caso célebre da paulista Leni Fiorese, que ganhou apartamento de um quarto do marido só para guardar suas roupas compradas na loja.
 

Para o cinqüentenário, fotos das 350 clientes mais fiéis e amigas estão em exposição na loja. São pessoas como as irmãs Renata e Rosana Camargo, da Camargo Corrêa; e boa parte da família Ermírio de Moraes. Carolina Andraus, 30, mulher do ex-senador e empresário Gilberto Miranda, também está na galeria. "A minha geração cresceu dentro da Daslu. Todas as meninas da minha idade - todas! - vão lá desde sempre." E não só as amigas do colégio Porto Seguro. "As meninas da FGV, onde estudei administração, também!" Segundo ela, "todas as meninas da cidade têm uma história pra contar de lá." Qual, por exemplo? "Quando marquei minha primeira viagem com o Gilberto, saí correndo desesperadamente para comprar dois vestidos: um Moschino lindo, vermelho, todo aberto nas costas, para um jantar em Mônaco com o príncipe Albert; e um Dolce & Gabbana preto, comportado, para jantar com o presidente da Portugal Telecom." E qual foi a maior loucura que já fez? "Não dá pra contar. Todo mundo faz muita loucura lá. Todo mundo compra muito." Ao lado de Carolina, o marido diz: "O que seria das mulheres de São Paulo se não fosse a Daslu?".
Para Miranda, "a Daslu acaba fazendo parte da vida de todo mundo da sociedade de SP. É a filha que trabalha lá, a amiga da filha. Todo mundo, do governador ao senador, está direta ou indiretamente ligado à Daslu". A filha do ex-governador Geraldo Alckmin trabalhou lá. A mulher, Lu, era cliente. Monica Serra prestigia as festas. Helena Sicupira, filha de Beto Sicupira, da InBev e na lista de bilionários mundiais da "Forbes", trabalha lá. "As vendedoras são lindas, têm opinião, consomem o que vendem. Você é chamada pelo nome. Chega e em dois minutos as moças já estão te paparicando, levando suas sacolas.
Parece que está na casa de alguém e não numa loja", diz Carolina, que já viajou para mais de 50 países e decreta: "Nem em Dubai tem uma Daslu. Minhas amigas que vêm de fora ficam maravilhadas. Aliás, todos os estrangeiros que vêm nos visitar eu mando para lá. A gente solta o gringo lá e só pega no fim do dia. É como mandar uma criança para a Disney."
Carolina discorda da opinião de que tanto luxo é incompatível com um país de tanta miséria, como o Brasil. "Nós temos que dar graças a Deus que o Brasil está melhorando, se atualizando. Isso é coisa de gente revoltada."
 

Renata Queiroz de Moraes, 28, mulher de José Ermírio de Moraes, viaja três vezes por ano para o exterior e vai a lojas como "10 Corso Como, em Milão, Jeffrey e Barneys, em NY. Não existe nada igual à Daslu. É aquela coisa da copeira impecável te servindo um capuccino, do cheirinho de home spray na loja toda, daquele ambiente "cozy" [aconchegante] que só a Daslu tem". Renata vai à loja "desde menina". Mas foi aos 15 que "começou a minha história de amor com a Daslu".
 

Dirce Piva Marques, 92, é a décima filha de um fazendeiro que cultivava café em Brotas. Ela é tia de Eliana e uma das primeiras clientes da butique. "A Lúcia fundou a Daslu. Ela tinha seis filhos, aquela correria.
Leva filho pro colégio, volta do colégio. Ela já estava pelas tampas...". Sonia Samaia interrompe: "Mamãe!". "É, pelas tampas, que é que tem?", continua dona Dirce. "E resolveu abrir a Daslu. Ela convocava a família toda para comprar lá." A filha, Sonia, virou cliente. A neta, Betina, vendedora. A bisneta, Alice, 10, desfila hoje para a Daslu Teen com amiguinhas do colégio St. Paul's. "Quando elas mudaram [da Vila Nova Conceição], fiquei com medo. "Ai, meu Deus, será que vai perder as características?", diz Sonia. Uma segunda "prova de fogo" foi a prisão de Eliana, acusada de sonegação e formação de quadrilha. "Isso tudo foi para esconder aqueles escândalos de Brasília", diz dona Dirce. A filha interrompe: "Mamãe!". "Mas é verdade!" (Para outras clientes, "foi difícil de aceitar no começo", diz Renata Moraes. "A gente rezava", diz Fá).
 

E qual foi a maior loucura que mãe, filha e neta já fizeram? As três soltam, juntas, um "aaahhh!!!!". Dona Dirce revela: "Uma vez comprei tanto, tanto, que cheguei em casa e pensei: "Meu Deus! O preço do café baixou. Como vou pagar tudo isso?'". Betina lembra das alheias. Como a da cliente que escondia as dezenas de sacolas no porta-malas para o marido não ver. Aos poucos, jogava uma por uma pela janela do quarto da casa, que era térrea.


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