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BIA ABRAMO
Televisão em trânsito
No ônibus e no metrô, telas substituem janelas e os poucos livros como alvo dos olhares
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A IMAGEM está se tornando
mais ou menos típica: passageiros de ônibus e metrô viajam de fones de ouvido e olhos numa
tela de LCD. Os fones voltaram às
ruas com a disseminação e popularização dos preços dos tocadores de
MP3. Circulando por São Paulo a pé,
de metrô e de ônibus, esbarra-se a
toda hora em pessoas de todas as
idades ouvindo sua trilha sonora
particular, os fios surgindo de mochilas, bolsas e bolsos.
No interior dos ônibus e vagões do
metrô, as telas de LCD substituem
as janelas e os poucos livros, revistas
e jornais como alvo dos olhares. Em
São Paulo, há dois serviços de TV
que cobrem várias linhas de ônibus
da região metropolitana, e um para a
linha verde do metrô.
Há algo que sugere isolamento e
alienação nesse transitar de olhos e
ouvidos atentos a estímulos outros,
alheio aos acontecimentos reais,
plugado nos virtuais. De certa forma,
é como se o sujeito que anda de ônibus, grudado nas imagens oferecidas
por essas TVs e escutando o seu som,
quisesse não estar lá. Mas há também uma nota simpática, de manifestação de uma vontade de deixar a
viagem no transporte coletivo mais
divertida e leve.
As TVs (ou sistemas audiovisuais)
dos ônibus e do metrô oferecem um
cardápio diversificado de conteúdo.
A TVMinuto, da linha verde, concentra-se mais em dropes de notícias (imagens paradas e legendas)
combinados com dicas de programação cultural pela cidade (e acessíveis pelo metrô).
A TVO, que cobre 164 linhas de
ônibus, ousa mais na "programação"; tem animação (pelo menos
uma ótima, os Pinguinics), piadas,
poemas visuais, receitas simples,
miniperfis de motoristas e cobradores, em vídeos de até um minuto e
meio. A BusTV vai mais ou menos na
mesma linha, mas, ao contrário das
outras duas, tem som, o que pode ser
um tanto impositivo e incômodo.
O tipo de conteúdo que pode ser
encaixado nesses sistemas é, evidentemente, limitadíssimo pelas diversas restrições tecnológicas e técnicas, mas, mesmo assim, poderiam se
experimentar outros formatos de
pequenas narrativas, até mesmo seriadas (para quem sempre pega ônibus mais ou menos no mesmo horário). Quem está em trânsito está
sempre mais disponível à distração.
E, claro, é muito interessante que
essa imagem futurista -pelo menos
no imaginário da década de 80, graças a "Blade Runner", os anos 2000
estariam invadidos por telas onipresentes- esteja associada aos transportes coletivos, uma espécie de bode expiatório do caos urbano paulistano e símbolo da precariedade e do
atraso da cidade.
biabramo.tv@uol.com.br
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