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Por meio de uma família, peça implode "misérias social e moral"
VALMIR SANTOS
ENVIADO A SÃO JOSÉ DO RIO PRETO
O pai é alcoólatra. A mãe, uma
mulher resignada. E os três filhos
do casal encerram a seguinte trindade: um travesti, um fanático religioso e um autista.
Eis a composição explosiva da
família de "Lusco-Fusco ou Tudo
Muito Romântico", espetáculo
das companhias mineiras Absurda e Acômica, sob direção de Eid
Ribeiro, que estréia hoje no Festival Internacional de Teatro (FIT)
de São José do Rio Preto (SP).
Ribeiro escreveu a peça em parceria com Marcus Tafuri. O ponto
de partida foi o romance "Profundo", do venezuelano José Ignacio
Cabrujas. Porém, quatro meses
depois de criação coletiva com os
atores, a dramaturgia estancou.
Foi retomada apenas meses
adiante, agora colocando-se, em
parte, aquele livro de lado e criando um texto com vida própria.
O resultado veio à luz há três
anos e se aproxima de uma transposição da história bíblica de
Caim e Abel para uma família
brasileira contemporânea, moradora em uma favela.
Entre canções de Roberto Carlos e fantasias pornográficas, desponta um retrato angustiante do
cotidiano daquela casa. "Misérias
social e moral", diz Ribeiro, 61.
Liame de amor e ódio. Ou lusco-fusco, ponte entre o final do dia e
o anoitecer.
O crente Abel (Herbert Tadeu),
filho mais velho, prega o apocalipse e cava um buraco onde deseja abrigar a família da ira do deus
seu. Jonilde (Nelson Bamban Júnior), o arrimo, tira o ganha-pão
fazendo programa com homens.
Elvirinho (Luiz Lerro), por sua
vez, podia se manter involuntariamente à margem dessa margem, dado o autismo, mas sucumbirá como uma espécie de
"ímã" na ciranda tragicômica.
O pai, o barbeiro Josué (Fabio
Furtado), é um beberrão que gosta de prostitutas. A mãe, Helenilde (Silvanha Stein), chafurda na
lamentação de passado que não
lhe dá trégua. Segundo Eid Ribeiro, a desagregação desse núcleo
representa simbolicamente a sociedade que o cerca.
O diretor procurou escapar ao
realismo chapado das cenas. "Há
toques de distanciamento, de estilização, para não facilitar a emoção bruta de alguns momentos."
Ele já encenou Kafka e Beckett em
sua companhia, a Absurda. Ao diretor, juntou-se uma nova geração por meio da cia. Acômica,
criada há quatro anos e revelada
por uma montagem de "As Criadas", de Genet.
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