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CINEMA/MEMÓRIA
Trecho do longa nacional "A Gigolette" (1924) acaba de ser restaurado pela filmoteca da Faap, que adquiriu o título sem saber
Acaso (re)descobre filme dos anos 20
SILVANA ARANTES
DA REPORTAGEM LOCAL
Na história do cinema brasileiro, "A Gigolette", longa-metragem de ficção dirigido em 1924
por Paolo Benedetti, era um dos
desaparecidos. Não mais.
A filmoteca da Faap (Fundação
Armando Álvares Penteado) acaba de concluir a restauração de
um trecho da obra, encontrado
por acaso, quando a instituição
realizou uma permuta com um
comerciante de material cinematográfico no Rio de Janeiro.
Em troca de cartazes, a Faap recebeu um lote de filmes. Quando
examinou o pequeno rolo misturado às latas de títulos conhecidos, o professor e pesquisador da
história do cinema brasileiro Máximo Barro, 74, intuiu a descoberta de relevo.
Barro reconheceu nas imagens
o ator Jaime Costa, com quem havia trabalhado décadas depois de
Benedetti, nos longas "O Pão que
o Diabo Amassou" (1957) e "Macumba na Alta" (1958).
Em "A Gigolette", Costa é o vilão que seduz e abandona Liz
(Amélia de Oliveira), grávida de
um filho seu. Mas Liz encontrará
o amor na figura de um médico,
disposto a casar-se com ela e criar
seu filho. O título do filme é referência à fantasia que o malandro
prepara para a mulher, nos dias
anteriores ao Carnaval.
O trecho recuperado é "provavelmente a seqüência final do filme", segundo Barro, que o exibiu
para a Folha, na sala multimeios
da Faap. Toda a cena ocorre num
amplo jardim, o que permite ao
professor lembrar que, enquanto
os europeus preferiam concentrar
suas filmagens em estúdios nesse
período, em razão da imprevisibilidade do tempo, os brasileiros filmavam também em locações externas, sobretudo no Rio, local da
produção de "A Gigolette".
Amélia Oliveira usa "toneladas
de rímel", como observa Barro,
"numa tentativa de copiar a maquiagem das atrizes italianas".
Em seus primórdios, o cinema
brasileiro se caracterizou como
uma atividade de imigrantes italianos, dos quais Benedetti era um
dos representantes.
O que faz Barro supor que os
três minutos restaurados correspondam ao desenlace de "A Gigolette" é a ação contida na cena.
Sob os olhares da mulher disputada pelo médico e o malandro, os
dois se envolvem numa briga corporal. Vencido, o malandro se retira com um andar ladino, acende
um cigarro e atira longe o fósforo.
A câmera retorna para o casal,
que se beija, enquanto um terceiro homem que observava a briga
retira do carrinho o bebê da gigolette, talvez porque ele chorasse.
Como era próprio da produção
de 1924, "A Gigolette" é mudo.
Nesse ponto, um humor provocante invade o filme. Entre observar o casal se beijando e dar chupeta ao bebê, o homem se confunde e aproxima da boca da criança
o cano de um revólver que trazia
nas mãos. E assim terminam os
únicos três minutos conhecidos
no Brasil de "A Gigolette".
Para recuperá-los, Barro e o
professor Eliseu Lopes Filho precisaram reproduzir cada quadro
do filme, em equipamento cedido
pelo empresário Airton Alves.
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