São Paulo, domingo, 20 de julho de 2008

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Para autora, noticiário e propaganda são "vilões"

Bia Rosenberg defende que crianças pequenas não devem assistir a telejornais

Escritora critica a veiculação de publicidade durante a programação infantil, prática adotada inclusive pela Cultura, onde trabalha


DA REPORTAGEM LOCAL

"Como fica a cabeça da criança que vê no telejornal a cobertura dramática do acidente da TAM e sabe que seu pai vai pegar um avião no dia seguinte?"
Bia Rosenberg, autora de "A TV que Seu Filho Vê", defende que crianças em idade pré-escolar não devem assistir a telejornais. "As imagens e a narrativa são muito impactantes, e elas ainda não têm condição de relativizar a informação", diz.
A psicóloga Rosely Sayão, colunista da Folha, acredita que, nessa idade, os pequenos ainda "não têm recursos para lidar com os dados de realidade". "É só observar o impacto negativo que as notícias sobre os assassinatos da Isabella [Nardoni] e do menino João Roberto, do Rio, tiveram sobre as crianças."
O pediatra Oswaldo Cudízio Filho, professor da Faculdade de Ciências da Saúde, também acha que os pequenos devem ser poupados das grandes tragédias, mas pondera sobre o não-acesso dos pré-escolares a noticiários. "É bom avaliar a maturidade de cada criança."
Rosenberg considera que após os sete anos já se pode ver telejornais, de preferência com os pais, que devem conversar sobre as notícias. Os filhos podem ser provocados a pensar sobre como o noticiário é feito.

Propaganda
A autora também é contrária à veiculação de publicidade na programação infantil, que "incentiva precocemente o consumismo". E, desde pequenas, diz, as crianças devem ser informadas de que os anúncios têm o objetivo de vender. Diretora de infantis na Cultura por 20 anos, a autora admite: "Acabar com a propaganda pode ser uma ameaça à produção para crianças. Mas é preciso buscar alternativas, como transferir fundos da propaganda em horário adulto para os infantis".
Apesar de ser uma TV majoritariamente mantida pelo Estado, a Cultura coloca em sua programação propagandas que estão nas TVs comerciais. Procurada pela Folha, a assessoria da rede afirmou que "a Fundação Padre Anchieta [que administra a Cultura] sempre adotou uma postura diferente do mercado com relação à publicidade infantil e respeita preceitos estabelecidos pelo Estatuto da Criança e do Adolescente". Também está "reduzindo gradativamente a publicidade voltada às crianças" e o número de intervalos, com "veiculação só entre um programa e outro".
A restrição à publicidade infantil é defendida por projeto de lei em discussão no Congresso. Para a Abap (Associação Brasileira de Agências de Publicidade), ele é "inconstitucional", pois o "Estado só pode legislar sobre publicidade de bebidas alcoólicas, medicamentos, tabaco, terapias e agrotóxico". "E quem pagará a produção de infantis? Essa senhora [Rosenberg] está propondo novo modelo de negócio, talvez que se aumente o preço de assinaturas da TV paga ou se cobre pela aberta", ironiza Dalton Pastore, presidente da Abap. A Abert, associação de TVs, diz que a restrição iria inviabilizar financeiramente a produção de programas infantis e que a publicidade já é auto-regulamentada pelo Conar.

Truque
Uma das críticas mais contundentes de "A TV que Seu Filho Vê" é às novelas das sete da Globo. "Usam o truque, um golpe, na verdade, de criar núcleo com crianças para atrair ibope infantil, e as tramas têm temática adulta", afirma Rosenberg. O livro cita pesquisa da Unicamp que contabilizou 900 beijos do protagonista de "Kubanacan" (2003) em 30 parceiras diferentes. Para a autora, isso estimula a prática de "ficar com várias pessoas".
A Globo rebate: "Infelizmente, o Brasil vive uma escalada contra a liberdade de expressão. A tal ponto que até uma comédia nonsense está sujeita a patrulha. Vale registrar que essa postura moralista é ainda mais sem sentido porque nossa programação passa, compulsoriamente, por classificação indicativa e porque cremos que, por mais qualificada que seja a autora, os pais-cidadãos são capazes de escolher o melhor para seus filhos". (LAURA MATTOS)


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