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ROMANCE/"O HISTORIADOR"
Saga trilha bom caminho sombrio
ALEXANDRE MATIAS
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Uma pessoa comum encontra algo incomum que a leva
em uma jornada fantástica, em
que ela será constantemente confrontada com seus próprios medos e angústias, até transpô-los e
alcançar uma espécie de redenção. Sim, é uma fórmula -mas
não foi o marketing que a inventou. Joseph Campbell que o diga.
É mais provável que tenha sido
o contrário, que a história tenha
inventado o marketing para que
pudesse ser contada para mais e
mais pessoas. Sejam as odisséias
de Ulisses, o país das maravilhas
de Alice, a Terramédia de Tolkien
etc. A saga é um formato testado e
aprovado muito antes do próprio
mercado de histórias.
Mas, depois que essas histórias
encontraram em rios de dinheiro
o melhor caminho para serem
multiplicadas, saíram das palavras impressas e passaram para as
imagens em movimento. Com o
século 20, o cinema assumiu o papel do papel, e a luz tornou-se o
narrador. Todas as histórias foram para a tela. Seduzidos pelas
imagens, tornamo-nos mais objetivos e impressionáveis, menos
sutis e críticos. O texto tornou-se
um acessório para o cinema.
Mas três filmes parecem ter prenunciado o esgotamento desse
formato. "2001", "Guerra nas Estrelas" e "Matrix" saúdam a transferência de mãos do poder hollywoodiano ao mesmo tempo em
que gera outro veículo -o livro
como subproduto. Graças à odisséia de Kubrick, as pessoas leram
ainda mais Arthur C. Clarke; a saga de George Lucas gerou inúmeros livros, enquanto a dos irmãos
Wachowski nos linkava a Baudrillard, Ballard e K. Dick. Um arco
ainda menor, de megaproduções
baseadas em megassucessos literários ("O Senhor dos Anéis",
"Harry Potter") consagrava um
movimento proporcional à nova
decadência dos estúdios: as pessoas voltaram a ler. "O Código Da
Vinci" e seus sucessores diretos
são só o começo dessa história.
Elizabeth Kostova dá continuidade -virando a página com seu
"O Historiador". O sucesso desses
livros não é a Igreja Católica, mistérios do passado ou a ligação
com Jesus Cristo, e sim o fato de
apresentarem, ao mesmo tempo,
descrições artísticas, arquitetônicas, históricas, ritualísticas etc. de
assuntos que estão longe do nosso
dia-a-dia. Kostova deixa o cristianismo de lado e vai para o outro
lado, a escuridão. E vai bem.
Como na tradicional saga, uma
adolescente descobre pistas que a
levam para um mundo de dor e
sofrimento, à medida em que a
autora nos apresenta a história de
Vlad, o Empalador, cruel genocida da Idade Média que inspirou
Bram Stoker a escrever "Drácula". Por trás de sua história, a protagonista se depara com a sociedade de preservação da maldade,
uma linhagem secular que atravessa os séculos até nossos dias.
Deixe Maria Madalena e a Mona
Lisa de lado -as sombras assumem a direção.
E Kostova flui bem. Tanto pela
história quanto geograficamente
-somos apresentado à história
do Leste Europeu, com impérios
otomano, bizantino e União Soviética ressurgindo dos mortos à
medida em que a história, contada em três tempos diferentes, se
desenrola. Mais Dan Brown que
Anne Rice, "O Historiador" é outro tijolo na pavimentação da estrada de volta à leitura. A história
é a mesma -o que importa é o
que acontece no caminho.
O Historiador
Autora: Elizabeth Kostova
Editora: Suma de Letras/Objetiva
Quanto: R$ 44,90 (540 págs.)
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