São Paulo, sábado, 20 de agosto de 2005

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

MERCADO EDITORIAL

"O Historiador", romance que já vendeu 959 mil cópias nos EUA, evidencia a gênese dos best-sellers

Equação tem olheiro, timing e laboratório

EDUARDO SIMÕES
DA REPORTAGEM LOCAL

Um novo fenômeno de vendas no mercado americano tem evidenciado a equação mercadológica da gênese de um best-seller. Lançado nos Estados Unidos em junho, "O Historiador", de Elizabeth Kostova, já vendeu 959 mil cópias e ocupa o segundo lugar na lista de mais vendidos do jornal "New York Times". A principal variável da tal equação, a publicidade, foi logo comprada pelo jornal inglês "Guardian", que incensou o título como o novo "O Código Da Vinci".
Exagero ou não, o fato é que o título recebeu tratamento de campeão de vendas já na fonte: estreante, Kostova faturou um polpudo adiantamento de US$ 2 milhões (cerca de R$ 4,7 milhões).
"O Historiador" baseia-se na seguinte questão: como seria se o Conde Drácula estivesse entre nós? Pouco confiante no poder de fogo de seu livro, Kostova acreditava que, depois de enviar o manuscrito a editores, receberia uma recusa polida, do tipo "lamento, mas este livro é tão estranho que não saberíamos como colocá-lo no mercado. Boa sorte".
Enganou-se. Em 48 horas seu agente tinha uma proposta e 45 minutos para aceitar ou não. Diante de tal prontidão, Kostova foi aconselhada a negociar. Fez um leilão, que durou seis dias, até o livro ser arrematado pela Little, Brown. O livro será lançado em 33 países, e a Sony comprou direitos de filmagem por US$ 2 milhões.
No Brasil, ele chega às livrarias nesta terça-feira. É o primeiro lançamento na América Latina do selo Suma das Letras, do grupo espanhol Santillana, via editora Objetiva, de que é acionista majoritário. O tratamento é de candidato a best-seller também aqui. A Objetiva já imprimiu 150 mil livretos com um trecho do primeiro capítulo, para promover o lançamento. A editora também está negociando com redes de livrarias um espaço privilegiado para exposição do título, cuja tiragem inicial será de 15 mil exemplares.
"Achei forte, bem escrito, com personagens verossímeis e um universo ficcional instigante, capazes de criar empatia com o leitor", defende o editor Roberto Feith, que, no entanto, prefere não comparar "O Historiador" a "O Código", pressupondo aí uma fórmula de sucesso, como a que garantiu, no passado, boas vendas para seguidores de sucessos como "O Perfume", de Patrick Süskind.
"É um tanto forçado. Entendo que tenha características parecidas, é romance histórico, com elementos de suspense e muita pesquisa. Mas não espero que venda 1 milhão de cópias no Brasil."

Gênese
Ouvidas pela Folha, Record, Objetiva, Rocco e Nova Fronteira dão pistas da gênese de um best-seller. Ressalvando que há surpreendentes sucessos espontâneos. A Sextante, que apostou e se deu bem com "O Código Da Vinci", não quis se manifestar. Nem a Companhia das Letras: "Para nós, o best-seller é conseqüência de um trabalho pelo livro de qualidade", diz Luiz Schwarcz, editor do fenômeno "O Mundo de Sofia", de Jostein Gaarder.
O processo inclui captação de informações do mercado, filtragem do corpo editorial da casa e, eventualmente, contratos de exclusividade, adiantamentos e musculosos planejamentos de marketing. No caso de um lançamento no exterior como "O Historiador", os primeiros sinais chegam às editoras nacionais através dos "scouts" [algo como "olheiros"], escritórios que repassam informações do mercado, das contratações às publicações. A Objetiva, por exemplo, tem "scouts" em Nova York e Paris. A Record também tem em Londres. E cada escritório pode ter apenas um cliente em cada país.
Feith cita a série de Eduardo Bueno como caso de aposta no potencial do autor, que recebeu adiantamentos para escrever um total de sete livros, dos quais três já foram publicados.
"O adiantamento mostra uma preocupação de dar continuidade a um projeto com potencial", diz Feith, que lançará o livro com tiragem inicial de 50 mil cópias.
Na Record, o recente sucesso de "Perdas e Ganhos", de Lya Luft, é exemplo de como um título pode surpreender até mesmo o mais experiente editor. Luciana Villas-Bôas conta que não dispunha de boa verba de marketing e lançou o livro com tímida tiragem inicial de 3.000 cópias.
"O Rio do Meio", que foi um sucesso de crítica, vendeu normal. No caso de "Perdas e Ganhos", eu não tinha noção de que tinha um best-seller nas mãos. Queria um romance e fiquei até acabrunhada", diz a editora, que já vendeu 500 mil exemplares do livro, desde o lançamento, em abril de 2003.
Ao ver que a tiragem inicial caminhava para se esgotar, Villas-Bôas acionou a editora para não deixar faltar exemplares nas mãos dos livreiros, que, na sua opinião, são alvo importante de uma estratégia de lançamento com grandes expectativas.
Carlos Augusto Lacerda, da Nova Fronteira, que em setembro lança "O Caçador de Pipas", do afegão Khaled Hosseini, divulgado como o maior sucesso da literatura mundial depois de "O Código", sugere que os trabalhos de Paulo Coelho posteriores a "O Alquimista" podem ser vistos como exemplos de uma fórmula que deu certo.
Para Vivian Wyler, gerente editorial da Rocco, que publica Coelho, há "estantes consagradas como fabricantes de best-sellers, ou seja, auto-ajuda e espiritualidade, romances de peripécias, aventuras, biografias etc".
"Hoje o mercado editorial internacional tende a comprar o livro pela "voz" do autor ou pelo tema. Se um editor identifica o nicho no qual o livro pode render melhor, a faixa de público na qual irá brilhar, ele é tratado "para render mais". No Brasil, este processo ainda engatinha. Mas a Rocco, por acaso, está aprimorando mais e mais seu laboratório. Por enquanto, sobretudo na não-ficção", diz Wyler.


Texto Anterior: Dança: Verve cria capítulos pessoais para interpretar o mundo em "Feique"
Próximo Texto: Romance/"O Historiador": Saga trilha bom caminho sombrio
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.