São Paulo, sábado, 20 de setembro de 2008

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Abujamra estréia peça como o "rei da incoerência"

"Começar a Terminar", feita a partir de temas recorrentes na obra de Beckett, tem apresentação confusa em Porto Alegre

Espetáculo, que chega a São Paulo no próximo dia 10, teve problemas técnicos e pareceu ainda inacabado no festival de teatro gaúcho


LUCAS NEVES
ENVIADO ESPECIAL A PORTO ALEGRE

"Quero ser o rei da incoerência", dispara o ator Antonio Abujamra, nos momentos iniciais de "Começar a Terminar", vôo livre sobre o universo de Samuel Beckett que estreou anteontem, no Porto Alegre em Cena. Pois o que se viu nos 45 minutos subseqüentes sugere que o anseio tem boas chances de se materializar.
O palco do teatro São Pedro recebeu um espetáculo nitidamente inacabado, um "brainstorming" confuso, feito a partir de personagens e temas recorrentes na obra do autor irlandês -desencanto, fastio, peso da memória e morte aí compreendidos.
Título e fio condutor são decalcados de "Começar a Acabar", monólogo do fim da década de 60 em que Beckett revisita algumas de suas criações célebres, como "Esperando Godot" e "Fim de Jogo". Mas a dramaturgia final é de Antonio Abujamra.
Na apresentação de anteontem, os microfones usados pelos atores (Miguel Hernandez e Natália Parrini dividem a cena com Abujamra) falharam quase que do início ao fim e, em vários momentos, a trilha sonora encobriu suas vozes -isso quando as falas não se atropelaram. A peça inicia temporada paulistana no próximo dia 10 de outubro, no teatro João Caetano, na Vila Clementino.

"Tragykomédiorgya"
Também para São Paulo (a partir da próxima sexta-feira) segue "Os Bandidos", a "tragykomédiorgya" de Friedrich Schiller (1759-1805) com que o Oficina celebra seus 50 anos, vista em primeira mão na capital gaúcha.
Em seis horas (das 20h20 da última quarta-feira às 2h20 de quinta), num espaço da Usina do Gasômetro (antigo centro de geração de energia) que reproduzia com bastante fidelidade a passarela da sede da companhia, o diretor José Celso Martinez Corrêa carnavalizou o duelo entre dois filhos da aristocracia alemã.
Aqui, Franz e Karl "fantasiaram-se" de Kosmos e Damian, logo convertidos em Cosme e Damião. Um almeja comandar a corporação midiática fundada pelo pai; o outro, enviado ao Brasil para gerenciar a filial, vive uma crise de identidade e torna-se líder de um bando de prostitutas, batedores de carteira, macumbeiros e menores infratores.
O embate entre o pragmatismo capitalista do primeiro e o idealismo desbundado do segundo (ou entre Apolo e Dionísio, como talvez prefira Zé Celso) serve de alegoria à luta que o Oficina trava há quase três décadas com o Grupo Silvio Santos pelo uso do terreno contíguo ao teatro, em São Paulo. As referências diretas à peleja com o empresário, salpicadas aqui e ali, agradaram à platéia.
O "desfile antropofágico" do Oficina abriu alas ainda para um He-Man (cooptado por Cosme) que se traveste de Che Guevara a fim de levar à Alemanha notícias do front latino-americano e para um Diadorim que, a certa altura, quase se afoga no rio Tietê, para desespero de Damião.
Cerca de um terço do público (537 ingressos foram vendidos) deixou a Usina ao fim do primeiro ato, de três horas e meia.
Nesse período, o bom aproveitamento da música (seis instrumentistas executam, ao vivo, a trilha do espetáculo) e dos vídeos (que enriquecem a história e vão além do caráter meramente decorativo) empolgou a platéia.
Quem ficou depois do intervalo viu uma segunda parte de ritmo mais frouxo, algumas cenas demasiado longas e atores já no limite de suas forças.



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