São Paulo, quarta-feira, 20 de outubro de 2004

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

ANÁLISE

TV Al Jazira mostra outro mundo árabe

ESTHER HAMBURGER
ESPECIAL PARA A FOLHA

Sem escombros, bombas, decapitações ou imagens de muçulmanos presos ou capturados. O mundo que a Al Jazira mostra todo dia em sua edição árabe é diferente do que estamos acostumados a ver nos noticiários televisivos ocidentais.
O planeta é a Terra, o tempo é contemporâneo. A tecnologia de gravação e exibição de imagens naturalistas também. Mas a "janela para o mundo" que a telinha revela se debruça sobre paisagens e realidades quase opostas aqui e lá. Sinal dos tempos.
Muitas vezes vemos o já familiar logo da emissora sediada no Qatar em emissões da Record, Globo, CNN ou BBC. Afinal nada como câmeras locais, na língua local, para captar eventos no calor da hora.
Na Guerra do Iraque aprendemos a reconhecer nas imagens da Al Jazira -marcadas por um grifo que lembra uma gota desenhada com capricho no canto inferior direito do quadro- relatos confiáveis, produzidos por jornalistas comprometidos.
A emissora se consolidou no mundo árabe como um canal privilegiado de construção de uma imagem visual alternativa ao que se veicula no ocidente.
Não vemos imagens de árabes feridos, humilhados ou em posição de ataque terrorista. As paisagens exibidas salientam a estabilidade de países prósperos, habitados por mulheres que aparecem como apresentadoras de TV, guardas de trânsito, motoristas e executivas desfazendo a expectativa convencional no ocidente.
Essa esquizofrenia das imagens é assustadora. Tem a ver com o clima de guerra de guerrilha que tomou conta do mundo depois dos atentados de 11 de Setembro e que às vésperas das eleições presidenciais norte-americanas enseja manifestações fundamentalistas radicais de parte a parte.
É como se o mundo globalizado permitisse a convivência momentânea de realidades virtuais conflitantes. Como que a alimentar um bárbaro espírito beligerante.


Esther Hamburger é antropóloga e professora da ECA-USP

Texto Anterior: Cinema: Ciclo homenageia Mário Audrá Jr., da cia. Maristela
Próximo Texto: Marcelo Coelho: Tempo, simplicidade e tecnologia
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.