São Paulo, Sábado, 20 de Novembro de 1999
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

4ª BIENAL INTERNACIONAL DE ARQUITETURA

Arquitetura da reconstrução


Começa hoje em SP a 4ª Bienal Internacional, que quer resgatar na população o desejo de cidadania


FRANCESCA ANGIOLILLO
da Redação

Os salões do pavilhão Ciccillo Matarazzo se abrem hoje, às 11h30, para mostrar a 4ª Bienal Internacional de Arquitetura. O evento, composto por 68 mostras e salas, não tem um tema ou tendência definidos, mas tem um objetivo que a norteia: dar subsídios ao habitante dos centros urbanos para que ele possa exigir seus direitos de cidadão.
Como? Os curadores da megaexposição respondem em eco: promovendo debates e exibindo projetos, realizados ou por realizar, das mais variadas épocas e procedências, que se afirmem como paradigmas. Informados das possibilidades que a arquitetura e o urbanismo oferecem em termos de qualidade de vida, os visitantes colocarão a questão: se lá é possível, por que aqui não seria?
Os organizadores da 4ª BIA deixam claro que, justamente por esse caráter didático pretendido, a exposição que inauguram hoje não é destinada ao público específico de arquitetos e estudantes.
O presidente da Fundação Bienal, o arquiteto Carlos Bratke, acha que a arquitetura, "infelizmente", ainda é encarada pela classe média como "cenário, como coisa de palácios franceses".
Bratke ressalta que, apesar do evento ter salas que se prestam a um "aprofundamento teórico", há uma série de outras que se aproximam do "homem comum" -justamente o tal que, leigo, tende a ver a disciplina como acessório, algo distante do dia-a-dia, e não como elemento modificador da qualidade de vida.
Quando Bratke se refere à teoria, ele cita o exemplo da maior das 47 salas especiais da mostra, a que é destinada ao arquiteto alemão Ludwig Mies van der Rohe (1886-1969), no 3º pavimento.
Purista, sofisticado, autor de edifícios leves, de aço e vidro e linhas retas, Mies era defensor do "menos é mais". Para um primeiro olhar, não habituado, sua arquitetura pode parecer exageradamente singela, mas a impressão desaparece ao observarmos a depuração das formas e o cuidado com o detalhe -o arquiteto costumava desenhar até mesmo o mobiliário para seus projetos.

Elementos aproximadores
Se, por um lado, o purismo alemão pode espantar o visitante desavisado, a sala de Mies é uma das que contam com elementos que Lucio Gomes Machado, arquiteto e um dos curadores do evento, vê como aproximadores do público.
"Não é só planta para arquiteto. Há muitas salas como a do Mies, com objetos que o público vê, reconhece", explica.
Nessa linha, outra mostra que deve chamar a atenção é "Danish Wave". São cerca de 60 exemplos de arquitetura e design dinamarqueses, que ilustram a tão propalada engenhosidade escandinava.
A criatividade começa nos painéis da montagem (feitos do mesmo material que os ímãs de geladeira, colocados sobre bases metálicas) e se estende a objetos de uso diário, como um aspirador de pó que ganhou alças e é usado como uma mochila.
"Na Dinamarca, homens e mulheres fazem o mesmo", diz, rindo, um dos organizadores da sala, ao vestir o equipamento.
Um dos aspectos mais interessantes exibidos na mostra dinamarquesa é a proposta de "bom desenho" para todos, que chamam de "atitude democrática".
Por exemplo, por que um deficiente auditivo deveria usar um aparelho feio, que tenta, inutilmente, esconder? Mais vale transformá-lo em acessório, dotando o aparelho de capinhas de plástico transparente e colorido, intercambiáveis, que o usuário pode selecionar de acordo com a roupa ou o estado de espírito. Um cruzamento curioso de "Champion Watch" (lembra?) com iMac, último objeto de desejo do design.
Outro exemplo de sala que pode fomentar o desejo de cidadania dos visitantes, para Machado, é a do arquiteto João Filgueiras Lima, o Lelé, que mantém na Bahia um centro avançado de tecnologia da construção e é visto como um paradigma, não só da técnica, mas também do conceito.
Seus projetos mais admirados são os dos hospitais para recuperação locomotora da rede Sarah Kubitschek, dotados de ambientes coloridos e arejados, em nada semelhantes aos odiados "ambientes hospitalares".
"Ver outras realidades aumenta o universo. Lelé é um arquiteto de altíssimo nível, pouco conhecido, até aqui. Será que não temos outros "Lelés" por aí, subvalorizados?", conclui o curador.
Além das salas e mostras, para cumprir seu objetivo de inspirar a cidadania, a 4ª BIA ainda tem programados uma série de eventos, como palestras e debates, e será acompanhada de lançamentos de livros e mostras paralelas, em outros lugares da cidade.



Texto Anterior: Programação de TV
Próximo Texto: Folha tem parcerias com Bienal
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.