São Paulo, Sábado, 20 de Novembro de 1999
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LÍNGUA PORTUGUESA

"Inculta e Bela" faz bom uso da grife Pasquale

ROGÉRIO ORTEGA
Coordenador do Programa de Qualidade

Resenhas de livros não costumam começar pela capa. Quem as faz tem de se concentrar, evidentemente, no conteúdo das obras: afinal, capas existem para ser espelhos mais ou menos fiéis -e, sobretudo, atraentes- do que vai dentro. Mas esta merece ser comentada.
Trata-se provavelmente da primeira vez que a capa de um livro sobre gramática estampa com tal destaque uma foto (na verdade, sete) de seu autor. Ora, se o tema é geralmente árido e sempre o mesmo, que diferença faz quem escreve?
Pasquale Cipro Neto tornou-se essa diferença. Sua presença na TV e no rádio e as colunas que assina em revistas e jornais (entre os quais a Folha) conseguiram fazê-lo popular ao lidar com um assunto que predispõe fortemente à antipatia: mostrar às pessoas que elas cometem erros de português -ou, para usar os termos mais suaves do professor, não seguem a norma culta da língua. Hoje, Pasquale é uma espécie de grife gramatical.
O livro "Inculta e Bela" faz bom uso editorial dessa grife. É uma compilação dos textos publicados por Pasquale na coluna semanal homônima, no caderno Cotidiano/São Paulo da Folha, entre novembro de 97 e dezembro de 98. As colunas estão dispostas em ordem cronológica e trazem um índice remissivo no final, o que reforça o caráter de "tira-dúvidas" do volume.
Sem pretensões à abrangência de uma gramática, o livro dá socorro a quem, por exemplo, precise saber a diferença entre "eminente" e "iminente" ou queira decifrar os mistérios da colocação pronominal. Mas seus textos, às vezes, podem ser lidos como crônicas -especialmente quando Pasquale recorre a histórias pitorescas para ilustrar os tópicos de que trata.

"Fundamentalismo"
Quem julgar o livro pela capa dificilmente se decepcionará. As características da grife estão ali -do recurso constante a letras de MPB, frases publicitárias e trechos de reportagens ao tom de bate-papo que entremeia as explicações professorais, dando-lhes leveza. Mas não só. "Inculta e Bela" desenha, para além da capa, um bom retrato do autor e de sua circunstância nos meios de comunicação por que transita.
Pasquale não faz jus ao rótulo de "fundamentalista" com que alguns querem, aparentemente, enfeitar-lhe a testa. Condena o que considera vícios da linguagem oral, mas insiste na diferença entre esta e a escrita, reconhece a diversidade de falas do Brasil, elogia certos usos coloquiais de palavras e expressões.
Ao que parece, nem sempre isso adianta. Tanto que as poucas passagens em que Pasquale deixa a delicadeza no armário são dedicadas aos linguistas ("idiotas, ociosos") que consideram a língua falada "sempre boa".
Não importa. "Inculta e Bela" diverte e é um bom instrumento de consulta para os não-ociosos. Seu único senão é repetir alguns temas, em virtude da ordem cronológica; isso faz mais sentido num jornal, com uma semana de distância entre cada coluna, do que num livro.
Nada que desanime, porém, quem insiste em falar português nestes tempos de globalização anglófona. "That's all, folks." Ou melhor: é isso.


Avaliação:    


Livro: Inculta e Bela
Autor: Pasquale Cipro Neto
Editora: Publifolha
Quanto: R$ 18 (152 págs.)




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