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"ESPELHO PARTIDO"/ROMANCE
Folhetim conta saga da elite catalã
SYLVIA COLOMBO
EDITORA DO FOLHATEEN
"Em "Espelho Partido" morre
muita gente. Oito ou nove
pessoas, se não me engano. Todas
tiveram que ir morrendo porque
eu quis assim, porque eu fui seu
destino." Na frase da catalã Mercé
Rodoreda (1908-83), está uma das
características mais constantes de
sua literatura, a idéia de que um
personagem deve surgir por inteiro, de sua construção ao seu desgaste na trama, o que pode significar, muitas vezes, a sua morte.
"Espelho Partido" obedece a
um estilo folhetinesco de narrativa, que lembra, por vezes, os livros de Nelson Rodrigues sob o
pseudônimo de Suzana Flag, há
reviravoltas, drama intrafamiliar
e a presença constante e trágica da
morte desde o início, como mostra a explicação da própria autora.
O livro acompanha a saga de
uma família da elite de Barcelona
desde meados do século 19 até
pouco depois de terminada a
Guerra Civil Espanhola (1936-1939). Dizer que é um romance
histórico pode explicar o livro,
mas de um ponto de vista um tanto reducionista. Sim, se trata de
um romance histórico, mas no
qual ela, a História, não se faz notar por fatos ou ditos conhecidos,
mas sim como uma força sempre
atuante e silenciosa no dia-a-dia.
Tudo gira em torno de uma moça simples que, após desilusão
amorosa, se casa com um triste
milionário atormentado pelo suicídio de uma amada no passado e
se torna a matriarca de uma linhagem marcada pela tragédia.
É um romance sobre uma época
em que as famílias carregavam
imensos segredos, às vezes em detalhes como uma jóia ou uma foto
guardada, noutras na identidade
de filhos bastardos, de quem a
real paternidade era escondida até
o túmulo. Há amores proibidos,
fratricídio, traições, suspeita de
um incesto, casamentos por interesse. E há a virgem que se mata
por não poder realizar sua paixão.
Rodoreda, autora do também
celebrado "Praça do Diamante",
tem uma habilidade notável para
desamarrar todo esse novelo. Seu
artifício mais interessante aqui é o
de promover um revezamento
dos pontos de vista a partir dos
quais a história vem à tona. Do
patriarca à mais frágil das crianças da família, todos têm sua inquietação pessoal em algum momento como condutora de parte
da história. Assim, dilui o protagonismo de um ou outro personagem e faz permanecer no primeiro plano o drama que se vive
sob as paredes daquele palacete.
Ao final, uma ratazana entra em
cena para contar o que vê sobrar
naquela casa. O desfecho, criativo
e surpreendente, faz lembrar o
fim da saga dos Buendía, em
"Cem Anos de Solidão", quando
as formigas se apoderam da história de uma família. Ou será que
não são todas que acabam assim?
Espelho Partido
Autora: Mercé Rodoreda
Editora: Planeta
Quanto: R$ 42 (310 págs.)
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