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Crítica/"Antologia Casseta Popular"
Humor destoa do "oba-oba" da cena carioca
ANDRÉ BARCINSKI
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Quem diz ter saudades
do Rio dos anos 80 é
porque não estava lá.
Blitz, Ritchie, Bete Balanço, Asdrúbal Trouxe o Trombone...
Era tudo muito colorido e muito, muito chato. Naquele marasmo pré-banda larga, um dos
pontos altos do mês era a chegada da "Casseta Popular" e do
"Planeta Diário" às bancas.
O "Planeta Diário" era mais
politizado. A "Casseta" era sua
prima mais escrachada e escatológica. Enquanto o "Planeta"
publicava títulos como "Depois
de ir à China, Sarney irá à merda", a "Casseta" não tinha vergonha de botar na capa uma fotomontagem do então candidato à presidência Fernando Collor, pelado, sob o título: "Botamos a nu o caçador de maracujás". A ministra da Economia,
Zélia Cardoso de Mello, aparecia vestida de dominatrix:
"Louca por um arrocho: ministra quer tirar o atraso".
A "Casseta" não poupava
ninguém. Destoava do oba-oba
indulgente e da brodagem que
ainda dominam a cena cultural
carioca. Atores, cantores, jornalistas culturais, todos eram
esculhambados sem dó. Sobrou
também para poetas do baixo
Gávea, estudantes da PUC, marombeiros de Copacabana e farofeiros do subúrbio. Oswaldo
Montenegro, Djavan e Gonzaguinha eram hors-concours.
Depois, Collor e sua trupe trataram de abastecer a "Casseta"
com munição de sobra.
Apesar de o humor da "Casseta" ser dependente de referências da época, a maioria dos
textos desta antologia envelheceu bem. Mérito da qualidade
do material, claro, e do jornalista Arthur Dapieve, que editou a
coletânea e fez o ótimo trabalho de limar piadas que hoje
soariam datadas ou incompreensíveis. Também fica óbvio, para quem acompanhou a
revista, que muitos textos mais
pesados não entraram na coletânea. Compreensível. Os tempos são outros, o politicamente
correto chegou, e os autores
não são mais estudantes da
UFRJ, mas astros da Globo.
O que não quer dizer que o
humor da "Casseta" apareça
domesticado ou comportado.
Quem, hoje em dia, teria a macheza de anunciar o debate
"Por que matamos Cristo", ou
publicar um jogo sobre o naufrágio do Bateau Mouche
("Venda suas passagens, encha
seu barquinho e... boa sorte!")?
Entre os destaques, estão a
cobertura da "Visita de Jesus
Cristo ao Rio", incluindo fotos
de uma noitada regada a pagode ("Ele extasiou os brasileiros,
mostrando a ginga e a graça do
crucificado de Jerusalém!").
Anúncios do Café Dunga -"Se
o Café Pelé já era ruim, imagina
esse!"- soam mais atuais que
nunca. E dá para ter um gostinho da origem das Organizações Tabajara no "Casseta
Shopping", que anunciava o
Descaroçador de Melancia Neguinho e o utilíssimo Decalque
de Olho, ideal para fingir que
está acordado durante o balé.
ANTOLOGIA CASSETA POPULAR
Organização: Arthur Dapieve
Editora: Desiderata
Quanto: R$ 69 (320 págs.)
Avaliação: ótimo
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