São Paulo, terça-feira, 21 de fevereiro de 2006

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POLÍTICA DO ROCK

Artistas nacionais ouvidos pela Folha analisam importância das megabandas para os grupos brasileiros

Músicos discutem influência de U2 e Stones

THIAGO NEY
DA REPORTAGEM LOCAL

O U2 é nome que arrasta milhares de fãs a seus shows brasileiros, motivo para suportar horas e horas em filas e enfrentar congestionamentos telefônicos. Mas sua música não é tão sentida como influência nas bandas de rock nacional.
A premissa surgiu a partir de uma comparação simples com os Rolling Stones, que parecem exercer muito mais influência na música jovem feita por aqui. Para conferir essa impressão, a Ilustrada ouviu algumas das principais figuras do pop brasileiro. E... bem, a maioria discordou.
Em seus comentários, grande parte dos músicos afirmou que, sim, o U2 pode ser considerado como influência de várias bandas roqueiras brasileiras. Mas, no momento de citar quais os grupos que beberam na fonte dos irlandeses, apenas um nome apareceu: a Legião Urbana.
"Discordo que o U2 não influencie bandas brasileiras", afirmou Tony Bellotto, guitarrista dos Titãs, que abriu o show dos Rolling Stones na praia de Copacabana, no Rio, enfrentado alguns problemas com o som na noite de sábado. "Nos anos 80, quando surgiu, o U2 influenciou muita gente do rock no Brasil, aí incluída a Legião Urbana, por exemplo. Mas desde o início dos anos 90 acho que nem Stones nem U2 influenciem muita gente."
Na comparação U2/Rolling Stones, os últimos saem ganhando porque fariam um rock mais universal, digerível e com referências mais claras; uma influência mais fácil de ser assimilada.
"O som dos Stones é atemporal, por mais que possa parecer o contrário. "Satisfaction", que é dos anos 60, ainda tem uma sonoridade interessante", afirma Edgard Scandurra, guitarrista do Ira!. "Respeito o U2, mas acho que é um grupo que remete muito aos anos 80, enquanto os Stones remetem à vida toda. Existe uma diferença absurda de importância histórica de uma banda e outra. O U2 é uma banda pós-punk, enquanto os Stones são a maior banda do mundo."
"Talvez os Stones tenham influenciado mais bandas no rock brasileiro porque estão há mais tempo na estrada. Além disso, suas próprias influências são, de certa forma, mais comuns: o blues e o rock dos anos 50. O trabalho do U2 é mais difícil de definir e, portanto, de imitar. Canções irlandesas, Beatles, o toque único da guitarra do The Edge, ritmos marciais, experimentações eletrônicas e rock se misturam numa alquimia complexa e difícil de ser alcançada por iniciantes incautos", opina Bellotto.
Dinho, o vocalista do Capital Inicial, concorda em parte com a idéia de que os Stones são mais ouvidos dentro do rock nacional. "Se falarmos de números absolutos, concordo. Mas especificamente na nossa geração, o U2 foi mais influente. Você vê nos primeiros discos da Legião Urbana uma influência evidente dos Smiths e do U2. Mas isso talvez seja uma coisa peculiar de Brasília. Lá não ouvíamos Stones. Ouvíamos metal, Sabbath, Zeppelin. De lá passamos para o punk. Fui ouvir Stones quando já era adulto", conta.
Para Dinho, no entanto, nem Stones nem U2 foram nomes fundamentais. "Quando começamos, os Stones eram leves demais. Depois, os punks se referiam aos Stones como Strolling Bones (ossos andantes). Os Stones eram velhos... Mas, hoje, é uma das poucas bandas de rock das quais tenho quase tudo. Mas para nossa formação musical, os Stones foram irrelevantes."

Velha-guarda
A influência dos Stones no rock brasileiro foi sentida, de acordo com João Barone, baterista dos Paralamas do Sucesso, pela turma anterior à geração 80.
"O U2 foi, sim, referência forte a partir dos 80. Como exemplo, temos a maior e mais popular banda de rock brasileira de todos os tempos, a Legião Urbana, que tinha fortes pinceladas do U2 em sua música. Quanto aos Stones, a turma da "velha-guarda" do rock nacional, como Mutantes, Raul, Rita e mais tarde Lulu e Barão -ainda com Cazuza- foram os que mais beberam dessa fonte. Talvez fosse apenas uma questão de momento, pré-anos 80, o fato desta turma ter se influenciado pelos Rolling Stones. Afinal, eles estão aí faz tempo, tocaram até na última ceia..."
Sempre que se fala em Stones no rock nacional, lembra-se de Barão Vermelho. Guto Goffi, o baterista da banda, acha que são dos poucos que carregam essa tocha. "Poucas bandas brasileiras foram influenciadas pelos Stones: Rita, Mutantes, Raul. Da geração 80, só o Barão teve essa influência de Stones, do blues. As bandas brasileiras da época foram mais para o punk rock. O U2 tem um som particular, um letrista muito bom e a música é uma moldura boa para aquele texto. É uma coisa da Irlanda, o The Edge tem um jeito de tocar... Sempre que alguém tenta imitá-los, se ferra."

Olimpíadas e Panamericano
E o que acha Dado Villa-Lobos, guitarrista da hoje extinta Legião Urbana, sobre o fato de o U2 ter influenciado sua banda? "Os Stones formam grande parte da cadeia de DNA; genética e fenótipo do rock mundial. São como as Olimpíadas: aparecem de quatro em quatro anos, e você vai ter que comparecer, não dá para perder. O U2? É tipo um Panamericano..."


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