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Réplica
Comentários de Marcelo Coelho fazem pensar que, se ele leu todo o livro, leu mal
AFFONSO ROMANO DE SANT'ANNA
ESPECIAL PARA A FOLHA
Estava eu fora do país
quando a Folha publicou uma resenha de
Marcelo Coelho a propósito de
"O Enigma Vazio: Impasses da
Arte e da Crítica" (Rocco). Tal
texto pode ser dividido em
duas partes: na primeira faz
uma paráfrase de informações
que estão no meu livro, sem citar a fonte; na segunda pretende emitir comentários críticos
sobre a obra.
E aqui o problema
maior. Ou ele não leu todo o livro, ou, o que leu, leu mal.
1. Acusa-me de "impaciência" diante dos autores analisados. E me pergunto: "Impaciência"? Estou estudando essa
questão há décadas, três livros
meus anteriores prepararam-me para este, fiz não sei quantas viagens a museus e bibliotecas, testei minhas análises em
inúmeros cursos e conferências, submeti o texto a vários
leitores especializados dentro
e fora do Brasil. Portanto, se
há alguém "impaciente", não
sou eu.
2. A seguir, diz, sem demonstrar, que expulsei "o ator de cena para tomar a palavra". Ao
contrário. Usando instrumentos da filosofia, retórica e linguística, enfrento o problema
da linguagem e a linguagem do
problema, desfaço a "estratégia
da indecisão" e o "double bind"
linguístico e ideológico por
meio do desmonte intertextual
das falácias de Duchamp, Paz,
Barthes, Derrida, Jean Clair
e outros.
3. Estranha ainda é a observação de que eu deveria ter
"bom-humor e ironia neste livro". Aí, fiquei sem saber se ria
ou se chorava. Releia o ensaio
"Na Sapataria de Jacques Derrida". Aí, entro na linguagem
do filósofo sofista, jogo o jogo
que ele joga, parodisticamente,
desconstruo a desconstrução
do criador do desconstrucionismo apontando seus equívocos na polêmica com Heidegger, Meyer Schapiro e F. Jameson. E, se você não achar humor e ironia nas alucinações
críticas de Barthes sobre Cy
Twombly, que remeto gostosamente para "O Homem que
Confundiu a Mulher com o
Chapéu", de Oliver Sacks, aí,
meu caro, o mal-humorado
não sou eu.
4. A coisa se agrava. Marcelo
se entusiasma e, uma vez mais
sem dar exemplos, acusa-me
de "amadorismo", de "falta de
ruminação acadêmica", e de fazer "citações de segunda mão".
Exclamo: "Jesus Christ!". Estou trazendo uma bibliografia
transdisciplinar nunca operacionalizada para estudar a
questão da arte contemporânea; estou revendo a teoria do
caos, a questão da entropia e
certos conceitos de física quântica em função da arte; estou
trazendo a neurociência para
tratar epistemologicamente da
agnosia visual e mental; estou
mostrando detalhadamente
como pensadores notáveis cometem notáveis equívocos; estou operacionalizando o "paradoxo do mentiroso" e a "argumentação em declive" para desarmar as armadilhas duchampianas; esmiúço as homonímias, paranomásias e anfibologias em Derrida, Barthes ou
Duchamp; enfim, estou mostrando que o rei não só está nu,
mas está vestido pela linguagem alheia, que é preciso ultrapassar os oxímoros paralisantes que coagularam a arte e a filosofia, e o comentarista da Folha não percebeu nada disso.
De resto, Marcelo diz que há
uns erros de revisão. Sempre os
há, qualquer autor sabe disso.
Se quiser anotá-los, eu os passarei à editora. Mas preferia
discutir ideias.
AFFONSO ROMANO DE SANT'ANNA é escritor e crítico, autor de "O Enigma Vazio: Impasses da
Arte e da Crítica" (Rocco).
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