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Record liga campanha institucional
a interesse por empréstimo público
DA REPORTAGEM LOCAL
Dennis Munhoz, presidente da
Record, vincula a campanha da
Globo à intenção da emissora de
obter empréstimo do BNDES
(Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social).
A Record, comandada pela
Igreja Universal do Reino de
Deus, abandonou em 20 de fevereiro a Abert (Associação Brasileira das Emissoras de Rádio e Televisão), da qual a Globo faz parte. E
declarou "guerra" contra a concorrente. Leia trechos da entrevista de Munhoz à Folha.
(LM)
Folha - O site Arca Universal, ligado à Igreja Universal, publicou reportagens, com tom opinativo,
contrárias à Globo e à possibilidade de a emissora receber dinheiro
do BNDES para pagar dívidas. A saída da Record da Abert, também por
essa razão, teve conseqüência?
Dennis Munhoz - Procuramos o
ministro Luiz Gushiken (Comunicação de Governo) e dissemos
que não concordávamos com o
dinheiro do BNDES para pagamento de dívida, e sim para investimento. Ele, quando tomou ciência dessa falta de unanimidade
entre as redes, mostrou espanto,
porque pensou que a coisa estivesse decidida. Sugeriu-nos que
procurássemos o presidente do
BNDES (Carlos Lessa). Estivemos
com Lessa no Rio e entregamos
documento manifestando a nossa
discordância. Ele admitiu que o
tema tomou uma proporção
maior, que deveria se tornar discussão pública, quem sabe no
Congresso, porque essa falta de
unanimidade era preocupante.
Folha - O sr. já viu a campanha
institucional da Globo?
Munhoz - Gostaria de deixar claro que não temos nada contra a
Globo, mas filosoficamente somos contra o empréstimo de dinheiro público para pagar dívida
de empresa privada. É que hoje,
claro, todo mundo sabe que grande parte desse dinheiro é para pagar dívida da Globo. Como foi
criada essa dívida da Globo? Qual
é o motivo de essa dívida crescer
de uma forma astronômica? Foram com atitudes monopolistas.
A Globo comprava todos os eventos, pagava duas, dez vezes o valor
do mercado, muitas vezes até para não exibir. Mas só para impedir
que os outros exibissem. Não é
justo que a sociedade pague por
uma atitude monopolística.
O exemplo mais gritante é a Copa do Mundo. Até 1998, todas as
redes pagavam reunidas US$ 10
milhões pela Copa. Isso, dividido
por cinco, dava em média US$ 2
milhões para cada uma. O público
tinha opção de assistir pela emissora que quisesse, a emissora negociava comercialmente o evento
e tinha até lucro. Mas a Globo
procurou a empresa detentora
dos direitos de 2002 e 2006 e ofereceu US$ 240 milhões. É lógico
que é impossível isso dar lucro.
Quem assume esse risco tem
que pagar a conta. Você assume o
risco de contratar um profissional
por dez vezes o que ele vale no
mercado, comprar o evento para
deixar na prateleira e o outro não
usar. É uma competição desleal
com as outras emissoras.
Folha - Então o sr. vê relação dessa campanha institucional com o
empréstimo do BNDES?
Munhoz - Estão tentando confundir a opinião pública, e isso é
perigoso. A coisa tem que ser clara. Se forem emprestar o dinheiro
para a Globo, OK, a opinião pública tem que estar informada sobre
isso. Não pode é tentar jogar areia
nos olhos de todo mundo.
Folha - A campanha para se posicionar como defensora de conteúdo nacional e empresa cidadã funciona como argumento para angariar empréstimo do BNDES?
Munhoz - Então, em nome de
produção de conteúdo nacional,
você vai ter uma benesse? Eles estão tentando jogar para a opinião
pública que a Globo é essencial,
que não pode quebrar, que não
pode acontecer nada com ela. Por
que a Tupi acabou, a Excelsior, a
Manchete? Por que o BNDES
nunca emprestou dinheiro para a
mídia, e, coincidentemente, agora
que a Globo está nessa situação
difícil, surge essa linha de crédito?
São perguntas que o BNDES não
responde, que a Globo não responde.
A Tupi, quando quebrou, era
mais forte do que a Globo. Tem
gente que trabalhou na Manchete
e até hoje não recebeu a rescisão
do contrato. Como é que foi a
preocupação do governo com esses trabalhadores? E agora, com a
Globo, o tratamento tem que ser
diferente? O assunto está sendo
tratado de forma velada.
Folha - O sr., então, não acha que
seja uma coincidência que essa
campanha institucional esteja
ocorrendo nesse momento?
Munhoz - Não, lógico que não. É
lógico que ela está tentando fazer
com que a opinião pública se sensibilize. Está lutando com as armas que tem, fazendo o que é certo para ela. Está tentando marcar
a questão da geração de conteúdo.
Mas isso não é exclusividade dela.
Há várias emissoras produzindo,
que até gostariam de produzir
mais. Mas quando a gente tenta
fazer uma novela própria, vamos
procurar os autores, eles estão na
Globo, sem trabalhar, mas não
podem trabalhar com você. A
Globo pega cem artistas, utiliza
dez. Os outros 90 não está utilizando. Claro, paga os salários,
mas está impedindo que essas
pessoas trabalhem em outras
emissoras. E a gente só não tem
mais conteúdo nacional porque
falta autor, roteirista, artista.
Folha - E para o poder público? Essa campanha da Globo é eficiente?
Munhoz - Não acredito. A Globo
tem um passado. Acho preocupante que o congressista participe
dessas campanhas, porque vai
contra a opinião pública. Eles foram eleitos pelo Brasil inteiro. Devem dar satisfação a todo o povo
brasileiro, e não a uma empresa.
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