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POPLOAD
O pop vai comer a si mesmo
LÚCIO RIBEIRO
COLUNISTA DA FOLHA
O pop é uma coisa adorável.
Principalmente quando ele
se auto-reverencia, dialoga entre
si, se enche de citações próprias,
se canibaliza e, assim, se torna
mais pop ainda. E mais adorável.
Neste final de semana, Recife é
sacudido por mais uma edição do
famoso festival Abril pro Rock,
um dos principais eventos da música independente nacional, que
aborda os indies em suas várias
camadas. Sim, a música independente, se você não percebeu, há
algum tempo tem várias camadas. E o produtor do festival, o conhecido Paulo André, um dos heróis da música independente nacional da época que a música independente nacional precisava de
heróis, está atento a isso.
O Abril pro Rock 2006 vai ter
atrações gringas (o alemão Stereo
Total, o DJ americano Diplo), os
indie-cult Cidadão Instigado (CE)
e Orquestra Imperial (RJ), os "populares" Cachorro Grande (RS) e
Angra (SP) e os indies-da-hora
Montage (CE), alguns nomes da
ceninha local. Mais umas 20 outras atrações em seus dois palcos
Mas o Abril pro Rock não vai ter
The Playboys, sexteto punk-zoeira de Recife. E, numa das (re)ações mais legais do cenário nacional nos últimos tempos, o "desprezado" The Playboys vai lançar
amanhã no próprio Abril pro
Rock o single "Paulo André Não
me Ouve", já exposto na internet
há algumas semanas (www.theplayboys.com.br).
Punk pegajoso com tecladinho
e vozes sampleadas, "Paulo André Não me Ouve" é um bem-humorado libelo "revanchista" contra a não-escalação do Playboys,
banda indie da cena recifense, no
gigante (padrões underground)
festival de Paulo André.
"Paulo André, não me ouve/
Paulo André, não me ouve/ Não
presta atenção no meu release e
CD/ Se eu não tocar no Abril pro
Rock, como vou aparecer na
MTV", diz a longa letra, que cita
as "intenções" da banda em fazer
sucesso, outros produtores de Recife, jornalistas pop locais.
"Paulo André, vamos ganhar
dinheiro juntos, cara/ A gente faz
uma música de vanguarda para
você/ Mas por favor me exporta
para a Europa/ Eu quero ser exportado, cara", continua a letra,
que conta com um padrinho da
velha-guarda local, no caso Rogê,
lendário agitador do mangue bit
(ou beat) que está até em título de
música de Chico Science. É de Rogê a engraçada voz "Paulo André
foi ontem pra Nova York", sampleada, que permeia e finaliza a
música, indicando a possibilidade
(ou desculpa) de não conseguir
encontrar o Paulo André.
"A gente sabe que o Paulo André não consegue ouvir os milhões de CDs de bandas novas que
mandam para ele. Mas é nossa
função tentar chamar a atenção
dele do modo que dá", diz João
Neto, o vocalista. "Ele sabe que a
música não é para achincalhar ele.
Me disse que não ficou chateado.
Até achou legal."
No ano passado, em outro ato
de guerrilha indie, o então não-convidado The Playboys conseguiu alugar uma tenda "para vender coisas" na edição 2005 do
Abril pro Rock e participar de algum modo do festival. Acabaram
levando amplificadores e improvisaram um show repentino, na
área comercial do Abril. Conseguiram atrair até o roqueiro gaúcho Wander Wildner para uma
participação especial. O lugar ficou conhecido como "Palco 3".
O Abril pro Rock, hoje, deve ser
novamente "invadido" pelo The
Playboys, que vai levar cem cópias prensadas às pressas de
"Paulo André Não me Ouve".
Paulo André vai ouvir The Playboys.
@ - lucio@uol.com.br
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