São Paulo, quinta-feira, 21 de maio de 2009

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62º FESTIVAL DE CANNES

"Faço filmes para todo o planeta"

Tarantino estreia em Cannes o global "Bastardos Inglórios", trama de guerra em que o astro é Brad Pitt

"Nós cruzávamos olhares e trocávamos bilhetinhos do tipo: "Eu gosto de você. Você gosta de mim?", diz o diretor, sobre flerte prévio com Pitt


SILVANA ARANTES
ENVIADA ESPECIAL A CANNES

Antes de estrear "Bastardos Inglórios", ontem, na competição pela Palma de Ouro do 62º Festival de Cannes, o cineasta norte-americano Quentin Tarantino anunciou: "Esse filme é meu monte Everest".
Trata-se do oitavo longa na carreira de Tarantino, 46, que transformou o pastiche de gêneros em marca registrada ("Pulp Fiction", "Kill Bill").
Pela primeira vez, ele abraça o "filme de guerra". A ação se situa entre 1941 e 1944, na França ocupada pelos nazistas. Também pela primeira vez, Tarantino dirige uma estrela hollywoodiana da grandeza de Brad Pitt. Até aqui, nos filmes de Tarantino, o astro era ele.
O flerte entre diretor e ator, no entanto, vem de longe. "Nós cruzávamos olhares à distância e trocávamos bilhetinhos do tipo: "Eu gosto de você. Você gosta de mim?'", disse Tarantino, ontem, na mais descontraída entrevista coletiva do festival.
Pitt manteve o mesmo tom. "Ele veio me ver no meio de um verão, com o roteiro. Conversamos muito e bebemos. No dia seguinte, quando acordei, vi cinco garrafas espalhadas pelo chão. Cinco! E um aparelho estranho para fumar. Aparentemente, assinei o contrato, porque, seis semanas depois, estava vestindo um uniforme."
O uniforme de Pitt em "Bastardos Inglórios" é o do tenente Aldo Raine, que comanda uma unidade de soldados judeus dedicada a eliminar a cúpula de oficiais nazistas.
Cabelos escuros, cicatriz no pescoço e um sotaque rural, Pitt faz um personagem impiedoso: "Não estamos aqui para dar a eles nenhuma lição de humanidade", diz Raine aos seus subordinados, de quem exige o escalpo dos inimigos abatidos.
As cenas de escalpamento e outras "práticas" de guerra dão a Tarantino a chance de introduzir os jorros de sangue comuns à sua filmografia. Intervenções gráficas pop e uma trilha musical que vai de Ennio Morricone a David Bowie também comparecem, fazendo de "Bastardos Inglórios" um filme de guerra à la Tarantino.

"Sonho de vingança"
Considerar o longa "um sonho de vingança judaica" não é despropositado, segundo Tarantino, mas, para ele, o elemento central é outro. "Meus personagens mudam o curso da guerra", disse.
Guinada europeia na carreira de Tarantino, "Bastardos Inglórios" foi rodado na Alemanha e na França, com um elenco multinacional. "Não sou um diretor norte-americano. Faço filmes para o planeta Terra."
No longa, os personagens falam suas respectivas línguas -francês, alemão, inglês, italiano-, enquanto o coronel Hans Landa, um carrasco nazista, expressa-se em todas elas. Tarantino disse que desistiria do filme e apenas publicaria o roteiro, caso não encontrasse o ator ideal para interpretar o coronel -o austríaco Christoph Waltz.
Ao ouvir o elogio, Waltz levantou-se e deu um beijo em Tarantino. O ator Daniel Brühl ("Adeus, Lênin") repetiu o gesto, quando Tarantino o citou. "Eu tinha 16 anos quando vi "Pulp Fiction" e pensei: "Um dia, quero fazer um filme de verdade". Catorze anos mais tarde, esse cara me chama para um teste", contou Brühl.
A idolatria generalizada a Tarantino é uma característica de Cannes, desde que ele estreou no festival, com "Cães de Aluguel" (1992). Neste ano, porém, um clima de suspense o cerca.
Tarantino e a atriz francesa Isabelle Huppert tiveram uma rusga durante a preparação do filme, e ela desistiu do principal papel feminino. Depois, foi nomeada presidente do júri do festival. A dúvida é se o atrito influirá na opinião de Huppert sobre "Bastardos Inglórios". Tarantino disse achar que não.
"Não tenho medo. Não ficou nenhuma acrimônia entre nós", afirmou, depois de dizer: "Ninguém adora Isabelle Huppert mais do que eu" e atribuir a desistência da atriz a "problemas de agenda e contrato".

NO BLOG - Leia o diário do festival

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