São Paulo, segunda-feira, 21 de junho de 2010

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Rio refaz performance de Lygia Pape

Artista criou "Divisor" em 1968, durante a ditadura no Brasil; filmagem será exibida na Bienal de São Paulo

Obra foi recriada no MAM carioca pela 1ª vez depois de sua morte, em 2004, com 130 pessoas vestindo um manto

SILAS MARTÍ
ENVIADO ESPECIAL AO RIO

No auge da ditadura, Lygia Pape estendeu um grande pano em frente ao Museu de Arte Moderna do Rio. Tinha fendas para que convidados enfiassem a cabeça e agitassem o corpo sob um manto branco, mar animado por braços e pernas invisíveis.
Obra de 1968, a performance "Divisor" foi refeita anteontem no mesmo lugar pela primeira vez depois da morte da artista, em 2004.
Cerca de 130 pessoas apareceram na tarde ensolarada de sábado para vestir a peça de 30 metros de largura.
Fizeram quatro caminhadas de dez minutos pelos jardins do museu no Flamengo.
Uma equipe de cinegrafistas registrou a ação num filme que será exibido na Bienal de São Paulo, em setembro. A performance também deve ser repetida, sob a marquise do Ibirapuera, no início da mostra paulistana.
Do alto do terraço do MAM, Paula Pape, filha da artista, comandava a massa de voluntários. "Esse espaço é muito especial, tem uma história com ela", disse ela à Folha. "Não sou artista, mas estou aqui fazendo uma homenagem a ela."
Com um megafone, Pape dava instruções. Animava os participantes, pedia sorrisos, orientava os passos.
Numa entrevista há 12 anos, Lygia Pape parecia antecipar esse momento.
"Queria fazer uma obra coletiva, que as pessoas pudessem repetir sem que eu estivesse presente", disse na época. "O processo só pode ser definido quando o artista desaparecer."

CABEÇAS E O MAR
Mas o mundo era outro antes desse desaparecimento. Esse gesto de Pape, de cortar as cabeças, escondendo os corpos, tinha outro significado no ano em que baixaram o AI-5, recrudescimento agudo da repressão.
"É cortar cabeças, e os corpos têm de se entender", descreve sua filha. "É uma questão política, mas parece o mar, é um poema visual."
Na Bienal de São Paulo, que pretende aproximar arte e política, a obra terá o caráter lúdico da performance refeita em tempos de paz.
"Esse outro lado é forte", diz a professora Maria Clara Amado, amiga de Pape. "Mas colocar alguém dentro da obra é uma atitude política."


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