São Paulo, domingo, 21 de agosto de 2011

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CRÍTICA DVD

Filme de Ophüls rompeu tabu na França pós-Segunda Guerra

"A Tristeza e a Piedade" explora a colaboração francesa com os nazistas

INÁCIO ARAUJO
CRÍTICO DA FOLHA

Num dos ótimos extras de "A Tristeza e a Piedade", o diretor Marcel Ophüls queixa-se de que, até 1972, seu filme só havia passado em cinemas na França, mas nunca na TV local, embora feito para TV.
É estranho, mas não incompreensível. "A Tristeza e a Piedade", de 1969, tocava num assunto tabu até então: a política de colaboração com o ocupante alemão durante a Segunda Guerra, levada pelo governo do marechal Pétain.
Desde que volta a Paris, em 1944, depois de anos no exílio, o general De Gaulle, líder das forças de resistência, executa a sua estratégia: permitir que alguns bodes expiatórios paguem pelo papel vergonhoso da França na guerra e unificar a nação.
Fazia sentido: enaltecer a Resistência, denunciar os traidores e fim de conversa.
Mas o que havia no meio? Bem, foi um tanto esquecido até que surgisse "A Tristeza e a Piedade", com uma nova visão do período, em que não havia apenas heróis e vilões.
Entre esses dois extremos existiu, para começar, o cotidiano: as "pessoas comuns" que lutavam para viver num momento de grande penúria.
Entre eles os judeus (logo presos e mandados para campos de concentração), claro. Mas também os indiferentes, para quem a política era (ou fingia-se que era) um aspecto secundário do mundo. E os que acreditavam no velho marechal, figura paterna que prometia salvar a França pela aliança com os vencedores.
Para reabrir a questão, Ophüls optou por fixar-se em uma cidade: Clermont-Ferrand. Lá estiveram os personagens dessa trama, os quase 40 entrevistados do filme.
Alguns têm histórias fantásticas, como Pierre Mendès-France, futuro primeiro-ministro francês, que narra a fuga da prisão a que foi condenado por deserção (e revela, de passagem, a presença de Valéry Giscard d'Estaing, futuro presidente, entre os quadros do governo de Vichy).
Mais fantástica ainda é a narrativa de Christian de la Mazière, jovem fascista que, no final da guerra, integra o grupo de franceses que se juntam ao Exército alemão.
Ou ainda a do espião inglês que se apaixona por um oficial alemão e pede para voltar à Inglaterra por não suportar a ideia de continuar traindo o companheiro.
Bela parte do impacto do filme deve-se ao uso dos cinejornais de época. São não só fragmentos mas trechos inteiros de filmes alemães e franceses.
O passeio de Hitler na Paris conquistada, na íntegra, é chocante. Assim como a tomada de Clermont-Ferrand pelos nazistas traz um tom de exaltatória violência.
Essa violência é até maior no processo do produtor cinematográfico (judeu) Bernard Natan, embora na maior parte do tempo os filmes franceses dediquem-se a um estranho faz-de-conta, no qual tudo no país, submetido aos alemães, era uma beleza. Uma aula de documentário.

A TRISTEZA E A PIEDADE
DISTRIBUIÇÃO Videofilmes
QUANTO R$ 55, em média
CLASSIFICAÇÃO não informada
AVALIAÇÃO ótimo



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