São Paulo, Quinta-feira, 21 de Outubro de 1999
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PANORAMA
Núcleo que aborda problemática de luz e cor em pinturas e fotografias é o segundo maior da mostra
Questões urbanas têm maior amplitude

free-lance para a Folha


De todos os núcleos do Panorama, o que tem maior destaque, melhor localização no museu e maior número de artistas é o dedicado aos problemas da vida nas grandes metrópoles, como solidão, abandono e medo. Talvez um sinalizador de que a arte de hoje vai mesmo por esse trilho.
A primeira visão que o visitante tem é uma parede revestida de espelhos, que duplica o espaço da sala, engole as obras expostas e as pessoas e inicia a discussão sobre a experiência da vida urbana.
Trata-se de um fragmento da instalação de Ana Maria Tavares, "Exit", constituída por uma escada de aço inox que reproduz uma escada de avião e pelos espelhos.
Subindo a escada, o espectador, que a artista prefere designar passageiro, tem um fone de ouvido a sua espera. Compenetrado em equilibrar-se e estupefato pelo áudio, o visitante talvez não se dê conta de que acaba de inverter as relações do lugar: observa o museu de uma perspectiva inusitada, situado em um pedestal.
Outro capítulo na radicalização da arte é a obra de Oriana Duarte. A artista apresenta registros de um trabalho que desenvolve desde 97. Ela percorre cidades do país mostrando a mesma performance: tomar sopa de pedras.
A sopa é feita com as pedras do lugar de onde está chegando e da cidade onde está no momento. Em São Paulo Oriana não fará a performance, que pode ser vista em um vídeo no MAM, ao lado dos suvenires da itinerância.
"Os suvenires mostram essa impossibilidade que é a tentativa de arrastar o lugar, é uma gozação levada ao extremo e também uma crítica à arte atual, auto-suficiente demais", diz.
Os outros artistas do núcleo são Sebastian Arguello, Rubens Azevedo, Ricardo Basbaum, Enrica Bernadelli, Domitília Coelho, Patrícia Furlong, Christine Liu e Vilma Sonaglio, além de Paula Trope cujo trabalho, premiado em 95, é o eixo desse segmento.

Luz e cor
No núcleo que discute cor e luz na pintura e na fotografia, em torno da obra "Mastros", de Alfredo Volpi, o segundo maior do Panorama, é curioso notar como trabalhos fotográficos atualizam discussões intrínsecas à pintura.
Ricardo Carioba faz intervenções diretamente nos negativos, interessado na materialidade da imagem. Em alguns trabalhos, usa filmes virgens. "Na máquina de revelar há sensores que captam mesmo o filme intacto", explica.
O resultado é difícil de distinguir de uma pintura. "Quando coloco o vermelho na foto, não estou falando do significado que se conhece de vermelho. A idéia é relacioná-lo com a forma, pouco no âmbito consciente, mais no âmbito sensível. Quero ampliar possibilidades da consciência."
A ampla pesquisa dentro de uma linguagem que se poderia julgar limitada avizinha-se das preocupações de José Guedes, por exemplo. E abre uma discussão quanto ao predomínio da fotografia na arte contemporânea. Cerca de 15 artistas da mostra expõem fotos ou obras que utilizam algum elemento da fotografia.
Ela possibilita uma agilidade de construção de imagem, além de ser uma técnica libertária. Com toda a tecnologia, o artista tem de se preocupar mais com a idéia, menos com o artesanato.
A dissociação entre criação artística e manufatura está presente em vários outros trabalhos na mostra, apontando outra característica forte da arte contemporânea. Também estão no núcleo de luz e cor Vânia Mignone, Fábio Noronha, Sérgio Sister e Teresa Viana. (JULIANA MONACHESI)


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