São Paulo, Quinta-feira, 21 de Outubro de 1999
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MOSTRA DE CINEMA "MENTIRAS"
Coreano traz sexo como diferença e libertação

BRUNO GARCEZ
da Redação

Tapas, gritos de dor, sessões de açoitamento, porretadas. É essa a rotina do casal de amantes retratado em "Mentiras", que a Mostra exibe hoje em São Paulo. Mas que ninguém se engane. Trata-se de uma história de amor.
Mas de um amor levado ao seu limite, sem qualquer glamour hollywoodiano. Do tipo que faria a cena da manteiga de Marlon Brando com Maria Schneider em "O Último Tango em Paris" parecer brincadeira de médico.
Segundo seu realizador, Jang Sun Woo, o filme é "uma história sobre a vida e o amor. Embora o amor nem sempre seja espetacular". Definição precisa. Os amantes de "Mentiras" são pessoas como outras quaisquer, mas que se entregam de forma incomum.
A fim de realçar a idéia de que estamos diante de pessoas banais não nos é dada sequer a chance de saber seus nomes, só as iniciais. A estudante de 18 anos é Y. O escultor vinte anos mais velho é J.
O rumo que o amor de Y e J toma nada tem, no entanto, de banal. No início, limitam-se ao sexo, digamos, convencional. Logo passam para jogos eróticos que envolvem o autoflagelo e a humilhação, auxiliados por acessórios como varas de bambu e chicotes.
O sexo passa a ocupar suas vidas em tempo integral. J abandona seu lar e sua família. Y larga o colégio. O pouco dinheiro que lhes sobra serve para financiar uma verdadeira turnê pelos motéis da Coréia do Sul. Tentam romper com qualquer laço social, mas cedo descobrem que tal empreitada é inviável.
"Mentiras" não deve ser tomado por pornográfico. É mais pudico, por exemplo, do que "O Império dos Sentidos", de Nagisa Oshima, ou "Romance" de Catherine Breillat, uma vez que as cenas de sexo são simuladas e, por vezes, até filmadas como se fossem um videoclipe.
Nada que justifique as críticas de católicos quando da exibição do filme no Festival de Veneza deste ano ou a reação da censura sul-coreana, que vetou a exibição da obra em seu país de origem.
Em "Mentiras", o sexo surge como uma desesperada tentativa de fugir de uma cultura repressiva. Um grito em favor da individualidade, como bem sintetiza Y na cena em que se nega a assinar um manifesto político: "Eu seria apenas mais uma em 1 milhão".


Avaliação:     

Filme: Mentiras Título original: Gojitmal Direção: Jang Sun Woo Produção: Coréia do Sul, 1999, 102 min Com: Kim Tae Yeon e Lee Sang Hyun Quando: hoje, às 13h55, no Unibanco Outras exibições na mostra: dia 28


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