São Paulo, terça-feira, 21 de outubro de 2008

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32ª Mostra de SP

Português faz melodrama documental

O filme "Aquele Querido Mês de Agosto", de Miguel Gomes, mistura ficção e realidade em vilarejos no interior do país

Diretor conta que, em visita à região nas férias, teve a idéia para uma história "construída com repertório musical dos bailes de aldeia"


LEONARDO CRUZ
EDITOR-ASSISTENTE DA ILUSTRADA

O que é "Aquele Querido Mês de Agosto"? Um melodrama sobre a descoberta do amor e do sexo por dois adolescentes?
Um documentário sobre os bailes e festas de verão na região da Beira, no interior de Portugal? Na verdade, a surpreendente fusão dos dois, um melodrama documental.
Em junho de 2006, o diretor Miguel Gomes se preparava para rodar, dali a dois meses, seu segundo longa-metragem, uma ficção sobre o amor entre músicos de uma banda que tocava em vilarejos no miolo do território luso no mês das férias na Europa. Foi quando seus produtores lhe disseram que a verba que tinham não seria o bastante para filmar todo o roteiro.
"Passei ao plano B", diz o cineasta, por e-mail. "Parti para a região com uma pequena equipe -eu mais cinco pessoas- e uma câmera de 16 mm, para filmar tudo o que me parecesse importante, deixando o argumento para depois. Se filmasse aqui verdadeiras procissões e bailes, já não teria que os recriar com o dinheiro do filme."
Gomes então editou o material captado e reescreveu seu roteiro, inserindo as passagens documentais. Voltou à Beira no agosto seguinte e rodou a parte ficcional usando amadores da região e técnicos de sua equipe como intérpretes. E depois misturou tudo na montagem, criando um filme elogiado pela crítica francesa em sua estréia na Quinzena dos Realizadores do último Festival de Cannes.
Habituado a passar férias na Beira, na casa de sua família, o diretor conta que teve a idéia para o filme ao "assistir a um bailarico numa aldeia", quando o guitarrista e a vocalista da banda se desentenderam. Pela relação dos dois, achou que talvez fossem namorados.
"Mais importante que isso, pensei que, a partir de uma situação de concerto, não narrativa, se poderia extrair momentos de ficção tendo como personagens os membros de uma banda. Um melodrama construído com o repertório musical e os ambientes dos bailes de aldeia no interior de Portugal."
Para viver a cantora e o guitarrista, foram escalados dois jovens estreantes da região, a luminosa Sónia Bandeira e o também talentoso Fábio Oliveira. Ela é Tânia, e ele, Hélder, personagens que são primos enamorados, observados bem de perto por Domingos, o pai da moça. Este é interpretado por Joaquim Carvalho, que, segundo Gomes, originalmente seria o diretor de produção do filme.
E por que levar técnicos para a frente das câmeras? "Porque, se eu pedia às pessoas da terra para entrarem num filme e fazerem personagens, era justo que nós, os forasteiros, também fizéssemos. Uma mera questão de justiça social."

Homenagem ao "pimba"
O que amarra as partes ficcionais e documentais de "Aquele Querido Mês de Agosto" são canções populares, escolhidas após longa pesquisa. "Ouvimos centenas de discos, milhares de canções, que vocês chamariam "brega", e nós, "pimba". O nome "pimba" veio de uma canção famosa que tinha o seguinte refrão: "Se elas querem um abraço ou um beijinho, nós pimba, nós pimba"."
Sobre o uso de músicas de Roberto Carlos e Nelson Ned no longa, Gomes ironiza: "Muitas dessas canções são versões de canções brasileiras. Grupos portugueses roubaram-nas, e nós as roubamos deles".
Esse bom humor do diretor também é característica constante do filme, recém-escolhido para representar Portugal na disputa por uma vaga no Oscar. E haverá campanha para promover o longa nos EUA? A resposta, galhofeira, vem em inglês: "Are you joking?".


Leia a íntegra da conversa com Miguel Gomes
www.folha.com.br/ilustradanocinema



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