|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
32ª Mostra de SP
Português faz melodrama documental
O filme "Aquele Querido Mês de Agosto", de Miguel Gomes, mistura ficção e realidade em vilarejos no interior do país
Diretor conta que, em visita
à região nas férias, teve a
idéia para uma história
"construída com repertório
musical dos bailes de aldeia"
LEONARDO CRUZ
EDITOR-ASSISTENTE DA ILUSTRADA
O que é "Aquele Querido Mês
de Agosto"? Um melodrama
sobre a descoberta do amor e
do sexo por dois adolescentes?
Um documentário sobre os bailes e festas de verão na região
da Beira, no interior de Portugal? Na verdade, a surpreendente fusão dos dois, um melodrama documental.
Em junho de 2006, o diretor
Miguel Gomes se preparava para rodar, dali a dois meses, seu
segundo longa-metragem, uma
ficção sobre o amor entre músicos de uma banda que tocava
em vilarejos no miolo do território luso no mês das férias na
Europa. Foi quando seus produtores lhe disseram que a verba que tinham não seria o bastante para filmar todo o roteiro.
"Passei ao plano B", diz o cineasta, por e-mail. "Parti para a
região com uma pequena equipe -eu mais cinco pessoas- e
uma câmera de 16 mm, para filmar tudo o que me parecesse
importante, deixando o argumento para depois. Se filmasse
aqui verdadeiras procissões e
bailes, já não teria que os recriar com o dinheiro do filme."
Gomes então editou o material captado e reescreveu seu
roteiro, inserindo as passagens
documentais. Voltou à Beira no
agosto seguinte e rodou a parte
ficcional usando amadores da
região e técnicos de sua equipe
como intérpretes. E depois
misturou tudo na montagem,
criando um filme elogiado pela
crítica francesa em sua estréia
na Quinzena dos Realizadores
do último Festival de Cannes.
Habituado a passar férias na
Beira, na casa de sua família, o
diretor conta que teve a idéia
para o filme ao "assistir a um
bailarico numa aldeia", quando
o guitarrista e a vocalista da
banda se desentenderam. Pela
relação dos dois, achou que talvez fossem namorados.
"Mais importante que isso,
pensei que, a partir de uma situação de concerto, não narrativa, se poderia extrair momentos de ficção tendo como personagens os membros de uma
banda. Um melodrama construído com o repertório musical e os ambientes dos bailes de
aldeia no interior de Portugal."
Para viver a cantora e o guitarrista, foram escalados dois
jovens estreantes da região, a
luminosa Sónia Bandeira e o
também talentoso Fábio Oliveira. Ela é Tânia, e ele, Hélder,
personagens que são primos
enamorados, observados bem
de perto por Domingos, o pai da
moça. Este é interpretado por
Joaquim Carvalho, que, segundo Gomes, originalmente seria
o diretor de produção do filme.
E por que levar técnicos para
a frente das câmeras? "Porque,
se eu pedia às pessoas da terra
para entrarem num filme e fazerem personagens, era justo
que nós, os forasteiros, também fizéssemos. Uma mera
questão de justiça social."
Homenagem ao "pimba"
O que amarra as partes ficcionais e documentais de
"Aquele Querido Mês de Agosto" são canções populares, escolhidas após longa pesquisa.
"Ouvimos centenas de discos,
milhares de canções, que vocês
chamariam "brega", e nós, "pimba". O nome "pimba" veio de
uma canção famosa que tinha o
seguinte refrão: "Se elas querem um abraço ou um beijinho,
nós pimba, nós pimba"."
Sobre o uso de músicas de
Roberto Carlos e Nelson Ned
no longa, Gomes ironiza: "Muitas dessas canções são versões
de canções brasileiras. Grupos
portugueses roubaram-nas, e
nós as roubamos deles".
Esse bom humor do diretor
também é característica constante do filme, recém-escolhido para representar Portugal
na disputa por uma vaga no Oscar. E haverá campanha para
promover o longa nos EUA? A
resposta, galhofeira, vem em
inglês: "Are you joking?".
Leia a íntegra da conversa com Miguel Gomes
www.folha.com.br/ilustradanocinema
Texto Anterior: O mouse que ri Próximo Texto: Lanterninhas Índice
|