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TV
Com conflito iraquiano e a morte de Arafat, canal do Qatar toma lugar de redes brasileiras na preferência da colônia
Árabe Al Jazeera dobra o número de assinantes no Brasil
LAURA MATTOS
ISABELLE MOREIRA LIMA
DA REPORTAGEM LOCAL
Rua Barão de Duprat, centro de
São Paulo, meio-dia. Em um dos
vários restaurantes árabes da região da rua 25 de Março, o televisor sintoniza a Al Jazeera, e a
clientela vê a imagem de um soldado norte-americano no Iraque.
Chamado de "CNN árabe", o
canal do Qatar praticamente dobrou o número de telespectadores
no Brasil e na América Latina desde o início do conflito iraquiano.
Em março de 2003, a Multipole,
distribuidora da emissora no Brasil e em parte da América Latina,
contava com cerca de 1.600 assinantes. Hoje, diz ter ultrapassado
os 3.000, sendo que mais de 60%
deles são residentes no país.
Para grande parte da colônia, a
Al Jazeera e TVs de países como
Líbano e Arábia Saudita tomaram
o lugar da Globo, SBT etc. São
suas principais fontes de informação para os conflitos internacionais e notícias como a morte do líder palestino Iasser Arafat. Ver o
"Jornal Nacional" e novelas não é
nem de longe a primeira opção
para quem tem em casa, na língua
materna, telejornais e programas
à la Silvio Santos das arábias.
O comerciante libanês Wissam
Tahini, 32, que chegou a São Paulo há quatro anos, assiste aos noticiários da Al Jazeera todos os dias.
Para ele, a vantagem em relação à
TV brasileira é que a emissora qatariana "mostra a verdade" sobre
os conflitos do Oriente Médio.
"A rede exibe imagens de soldados norte-americanos matando
civis iraquianos, o que nunca aparece na televisão daqui. Muitas vezes, emissoras brasileiras chamam libaneses de terroristas,
quando, no Líbano, são heróis."
O jornalista sírio Munir Awad,
28, diz que, além dos telejornais,
gosta da programação cultural do
canal. Conta que instruiu a babá
de sua filha de dois anos a deixar a
televisão ligada durante todo o dia
para que ela aprenda a língua.
"A Al Jazeera também é interessante pelo lado educativo. Minha
filha entende quase tudo em árabe e já fala também", afirma.
Estereótipo
Na semana passada, em SP, foi
lançado o Instituto da Cultura
Árabe (www.icarabe.org), em debate com críticas à mídia norte-americana e à brasileira e elogios à
Al Jazeera, citada como alternativa para fugir dos estereótipos e se
aproximar mais "dos fatos".
De origem libanesa, o médico
Murched Taha, 54, membro do
instituto, assiste aos noticiários
árabes todos os dias "em razão de
sua independência" e por ser
"mais próxima da realidade".
"Além disso, muitas vezes ela
consegue trazer a notícia do
Oriente Médio antes de outras,
como a CNN em espanhol", diz.
Os libaneses Fadel Dirani, 39, e
Hassan Tirad, 36, ambos comerciantes, têm o costume de assistir
à Al Jazeera na casa de amigos. Para Tirad, as redes brasileiras "não
mostram a verdade". Dirani concorda. Diz que o canal do Qatar
tem "informação mais livre".
"Além de mostrar a verdade,
ainda incentiva valores culturais e
a família. A TV brasileira, principalmente no caso das novelas, tira
a base da família", diz Tirad.
Distribuição exclusiva
A distribuição dessa e de outras
TVs árabes começou no Brasil há
cerca de três anos e aproximou a
colônia de seus países de origem.
Antes disso, o comerciante libanês aposentado Fause Mustafá,
74, "caçava" notícias em sua língua por meio de rádios de ondas
curtas (capazes de sintonizar freqüências de longas distâncias).
Agora, passa o dia zapeando entre as opções do pacote árabe.
"Vejo muito pouco a TV brasileira", conta ele, que está no Brasil
há 50 anos e diz agora se sentir
mais próximo de suas origens.
Quando chegaram ao Brasil, a
rede do Qatar e outras eram recebidas gratuitamente. Bastava possuir uma antena parabólica e direcioná-la aos satélites de retransmissão. Segundo a Multipole, foi
uma estratégia de mercado para
atrair telespectadores e passar a
cobrar, o que ocorreu há cerca de
dois anos. Atualmente, para ter
acesso a um pacote com dez canais é preciso, além da parabólica
e de um decodificador digital (total em torno de R$ 1.500), pagar
uma assinatura anual de R$ 600.
A empresa atende seus clientes
em árabe. "A Guerra do Iraque
certamente ampliou o interesse
da colônia árabe por esses canais.
O mercado é crescente, apesar de
ainda distante dos 130 mil assinantes dos EUA", diz Maurício
Goldberg, presidente da Multipole. Único representante da Al Jazeera no Brasil, ele é judeu e ri desse paradoxo. "Esse é um modelo
de convívio pacífico que deveria
ser seguido em todo o mundo."
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