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Arte no vermelho
Crise financeira global diminui vendas em casas de leilões, feiras e galerias de arte, anunciando um período de estouro de bolhas e de reajuste de preços
FERNANDA EZABELLA
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
SILAS MARTÍ
ENVIADO ESPECIAL A NOVA YORK
Uma iguana muda de cor seguindo as oscilações de Wall
Street: verde indica uma alta;
vermelho, baixa. Ela está num
vídeo que recebe dados do mercado financeiro em tempo real.
A obra, que não foi vendida, esteve na Pinta, feira de arte latino-americana realizada semana passada em Chelsea, bairro
descolado de Manhattan, a algumas quadras do epicentro
mundial da crise das Bolsas.
E o vermelho apareceu forte
não só no réptil mas também
nas vendas: se no ano passado a
Pinta vendeu US$ 8,5 milhões
em obras de arte, este ano viu
sobrar mais da metade dos trabalhos no Metropolitan Pavilion, registrando negócios de
US$ 4 milhões.
"Estamos vivendo um momento muito difícil, de insegurança e falta de confiança no
mercado", disse Diego Costa
Peuser, um dos diretores da
Pinta, à Folha, em Nova York.
A crise atinge casas de leilões
e galerias. Para alguns é o prenúncio do estouro de uma bolha no mercado de arte, inaugurando uma era de reajuste de
preços -importantes galerias
londrinas já baixaram em até
40% os valores de obras.
Neste mês, a Sotheby's anunciou perdas de mais de US$ 50
milhões em leilões realizados
em Londres, Nova York e Hong
Kong. A Christie's, outra casa
poderosa de leilões, também
confirmou perdas milionárias.
Obras de artistas que mais
lucraram com o inchaço do
mercado, como o japonês Takashi Murakami, ficaram
"mais baratas". Ou sem comprador, como no caso agora de
Damien Hirst, que em setembro, antes do aperto, embolsou
US$ 200,7 milhões em um leilão histórico de suas obras.
"O mercado cresceu mais de
250% nos últimos dois anos, e a
crise financeira global obviamente trouxe uma correção",
disse Alex Rotter, diretor do
Departamento de Arte Contemporânea da Sotheby"s, após
leilão em Nova York deste mês.
"Essa venda nos leva de volta a
níveis registrados em 2006."
Na China, onde a arte contemporânea é a mais inflacionada do mundo, não é diferente. O mercado inchou de US$ 3
milhões em 2004 para US$ 194
milhões em 2007. Agora, em
um leilão em outubro, apenas
35% dos lotes foram vendidos e
muitas obras não chegaram aos
seus preços mínimos.
Já fora da esfera blockbuster,
no mercado mais tímido que é
o brasileiro, leilões neste mês
em São Paulo sofreram quedas
de 30% em relação a outros
deste ano. Alguns chegaram a
vender apenas 35% dos lotes.
"Acabou a bolha. Esse negócio de badalar artista, inventar
quadro, isso acabou. Mas, para
coisa boa, não tem crise", diz o
marchand carioca Alberto
Leon, que arrematou para
clientes as obras mais caras do
leilão de Aloisio Cravo -três
telas de Mira Schendel, por R$
100 mil cada uma, e um Wesley
Duke Lee, de R$ 200 mil.
Latinos no exterior
A Pinta, segunda feira de importância mundial a acontecer
depois da queda das Bolsas em
outubro, foi o primeiro termômetro para medir o impacto da
crise na arte latino-americana.
"No ano passado, nosso desempenho foi melhor", disse a
galerista Nara Roesler, que esteve na Pinta. "Vendemos mais
no ano passado", repetiu Raquel Arnaud, em Nova York.
Um dos poucos colecionadores brasileiros a circular pela
feira semana passada, José
Olympio folheava sem ânimo
um catálogo da galeria de um
amigo, adiantando que não ia
comprar nenhuma obra.
O amigo de Olympio é Frederico Seve, brasileiro radicado
em Nova York e dono da Latin
Collector. Sua galeria, na era da
bolha financeira em Wall
Street e no mercado de arte, subiu literalmente no mapa:
abandonou um espaço mais
modesto em Tribeca e rumou
para o Upper West Side.
"No ano passado, eu saí daqui
com cheques no bolso, este ano
só tive umas "vendocas" e uns
indicativos de compra", lamentou Seves. "Mas se venderam
metade do que venderam no
ano passado, é um triunfo, porque a crise é imensa."
"Esta é outra época", resume
Marga Pasquali, galerista de
Porto Alegre que teve de levar
sua obra mais cara, uma escultura de Saint Clair Cemin, de
US$ 125 mil, de volta ao Brasil.
"É inevitável o mercado sentir a crise, mas espero que a arte
consiga sobreviver a isso", disse
à Folha a curadora de arte latino-americana da Tate Modern,
Tanya Barson, em Nova York.
Mas se a crise deixa mais
contidos os colecionadores privados, os museus aproveitam a
baixa para aumentar o acervo.
Barson adquiriu para a Tate
um quadro de Arthur Luiz Piza, no estande de Raquel Arnaud. E Nara Roesler vendeu
uma obra de Milton Machado
ao Museo de Arte de Lima. "Essa feira teve muito boas entradas institucionais", diz Roesler.
"Antes, havia mais compradores, mas não eram museus."
O jornalista SILAS MARTÍ viajou a convite dos
organizadores da Pinta Art Fair.
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