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Crítica/"Mil Anos de Orações" e "A Princesa do Nebraska"
Wang discute globalização em longas de pouca personalidade
"Mil Anos de Orações" e "A Princesa do Nebraska" são lançados simultaneamente
CÁSSIO STARLING CARLOS
CRÍTICO DA FOLHA
Saudado com excesso de
entusiasmo nos anos 90,
graças à dobradinha com
Paul Auster que resultou em
"Cortina de Fumaça" e "Sem
Fôlego", Wayne Wang volta a
chamar a atenção com dois novos títulos que se completam
como o yin e o yang, após uma
década de longas esquecíveis.
Nascido em Hong Kong e
com filmografia realizada nos
EUA, Wang reproduz esse tipo
de identidade dupla em seu cinema, mas sem se equiparar ao
nível de Ang Lee, diretor com
percurso semelhante.
A duplicidade é também o sinal que acompanha cada passo
de "Mil Anos de Orações" e "A
Princesa do Nebraska", a começar da bilheteria, onde o espectador tem de se perguntar qual
dos dois títulos escolher ou, se
decidir ver ambos, por qual deles começar, já que estão em
cartaz nas mesmas salas em horários intercalados.
Ambos partem de uma mesma cena: um indivíduo de origem chinesa procura, no saguão de um aeroporto, um contato amigável em sua chegada.
O que há de comum entre eles é
o desenraizamento, a experiência de um passado que ficou para trás, mas ainda atuante.
O senhor Shi de "Mil Anos de
Orações" carrega o lenço vermelho, marca de seu vínculo
com o Exército e resíduo de fidelidade a ideais comunistas de
outros tempos. Por sua vez,
Sasha, de "A Princesa de Nebraska", carrega no ventre um
bebê, vínculo com uma paixão
que ficou na China e com quem
prolonga laços por torpedos e
vídeos feitos em seu celular.
"Mil Anos de Orações" está
ajustado a seu protagonista
mais velho, cujas tribulações o
filme narra de um modo calmo.
Já o inquieto percurso da jovem Sasha é mostrado com tiques modernosos, como câmera na mão, edição nervosinha e
ritmo desatento de YouTube.
Shi encontra-se fora de seu
espaço e de seu tempo, isolado
da cultura americana até por
conta da língua que não domina. Já Sasha não encontra acolhida no grupo de garotas de
sua idade nem entre os afáveis
sino-americanos que a recebem numa festa. Ambos estão
cindidos, como um dos efeitos
da globalização na qual se pensa que todos nos tornamos integráveis a qualquer lugar, o
que equivale a lugar nenhum.
Ao contrário de seus personagens, porém, que sofrem
com a indeterminação, o estilo
camaleônico de um filme ao
outro nos faz indagarmos se os
títulos revelam Wang como um
artista com habilidade para assumir múltiplas facetas ou de
alguém com assinatura, mas
sem personalidade alguma.
MIL ANOS DE ORAÇÕES e A
PRINCESA DO NEBRASKA
Produção: EUA, 2007
Direção: Wayne Wang
Com: Faye Yu, Henry O, Li Ling
Onde: a partir de hoje no Cinesesc e
Reserva Cultural 2
Classificação: livre ("Mil Anos...');
não indicado a menores de 14 anos ("A
Princesa...")
Avaliação: regular
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