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ANÁLISE
Mercado pode chegar a fase intermediária de recomposição
DO ENVIADO AO RIO
Além da funda crise econômica e de credibilidade, a indústria brasileira do disco vive
também um nítido período de
transição. Fora raras exceções,
ninguém mais vende as cifras espantosas que caracterizaram a
bolha de consumo dos anos 90,
primeiro por causa da popularização dos aparelhos de CD, no governo Collor, depois pela relativa
estabilidade adquirida com o Plano Real, de FHC.
Pelo lado perverso, esses acontecimentos atiçaram as gravadoras a se tornarem vorazes -perdidas na névoa do lucro fácil,
transformaram axé music, pagode e música sertaneja em hegemonia, sucateando cruelmente
seus catálogos e acervos.
Como "gravadora número 1", a
Universal se tornou também a
primeira colocada na barbárie.
Teve pouco pagode, mas amplificou o sertanejo e o axé ao limite
da náusea e da repetição absoluta.
Ao primeiro sinal de desgaste,
deslanchou uma calamitosa avalanche de discos ao vivo.
Esses se tornaram coletâneas
disfarçadas (e muitas vezes pessimamente gravadas), que se juntaram às pavorosas séries de compilações que foram desmontando e
retalhando, uma a uma, as obras
dos grandes, médios e pequenos
valores históricos da MPB.
O que não perceberam é que, na
soma dessas práticas todas, estavam as próprias gravadoras oficiais criando o sistema de corrosão que depois seria maximizado
e conhecido como pirataria.
A explosão dessa, principalmente a partir de 2001, foi em
grande medida antecipada pelas
próprias gravadoras, que habituaram o consumidor à compilação
barata, à falta de informação, à
padronização sonora, à regravação sem rigor de músicas sempre
repetidas. Era, explicitamente ou
não, um projeto de deseducação e
de sucateamento cultural.
É por isso que hoje, quando a
crise empurra a Universal a anunciar um ambiciosíssimo projeto
de recomposição, se chega finalmente a um tão necessário momento de transição para a reelaboração de identidade cultural.
Mesmo que toda a bela e descomunal promessa da Universal seja cumprida, muita coisa ficará
faltando. Mas ao menos estará em
curso um projeto de reeducação,
de devolução ao país de sua própria memória musical. EMI, Sony
e Som Livre (BMG e Warner já
vêm sendo ativas nesse cenário)
precisam seguir o exemplo, urgentemente. Cumprida essa etapa
intermediária, quem sabe então o
caminho esteja novamente aberto
ao que interessa: a boa formação
dos artistas jovens, a busca pela
nova música popular brasileira,
seu reencontro com a própria
identidade por enquanto perdida
e desorientada.
(PEDRO ALEXANDRE SANCHES)
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