São Paulo, quarta-feira, 21 de dezembro de 2005

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CINEMA

Alunos da Escola de Munique realizam curtas sobre isolamento dos ricos e desarmamento, entre outros temas

Estudantes alemães filmam raio-X do Brasil urbano e rural

Marlene Bergamo/Folha Imagem
Os estudantes David Vogel e Guilherme Haas, na av. Faria Lima


THIAGO STIVALETTI
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Estudante da Escola de Cinema e TV de Munique, o suíço David Vogel, 27 anos, visitou na semana passada um dos condomínios de Alphaville, perto de São Paulo. Foi entrevistar dois moradores para um documentário de dez minutos sobre o isolamento dos ricos na maior cidade do país. Esperava achar só uma área residencial protegida com aparatos de segurança, mas se surpreendeu com a infra-estrutura que faz desses locais verdadeiras cidades paralelas.
"É como se os ricos tivessem o sonho de ir morar na Lua e nunca mais voltar", observa. Alphaville lhe lembrou os assentamentos de judeus em território palestino, que conheceu tempos atrás. Uma das cenas que o impressionou foi a chegada de inúmeros ônibus de onde descem de manhã os empregados que trabalham nessas casas luxuosas, vindos de bairros distantes. "Nos assentamentos judeus também é assim: os ricos querem se isolar, mas dependem da gente simples que trabalha em suas casas", diz. "A diferença é que os judeus se recusam a contratar palestinos e passam a empregar filipinos e outros imigrantes asiáticos pobres nos assentamentos", conta.
Vogel veio ao Brasil como parte do projeto "Close Up", desenvolvido pela Escola de Munique -responsável pelo longa "Camelos Também Choram", indicado ao Oscar de melhor documentário. A cada ano, os estudantes são enviados a um país para desenvolver documentários de curta-metragem. Nos anos anteriores, eles foram ao leste europeu, México e Israel. Para isso, trabalham em parceria com os estudantes de alguma universidade local. Aqui, a escolhida foi a Unisul, em Florianópolis (SC).
Foram desenvolvidos seis projetos com temas brasileiros, filmados entre São Paulo, Rio e Santa Catarina (veja quadro ao lado). Para acompanhar os seis alunos vieram dois professores. Entre eles, Dieter Kronzucker, jornalista célebre na Alemanha por ter comandado um "talk show" no canal público ARD. "Além de aprendermos sobre outras culturas, produzimos material sobre temas que são negligenciados pela imprensa alemã", afirma.
Kronzucker esteve no Brasil há 35 anos para fazer uma reportagem para a TV alemã sobre a situação dos sem-terra, tema de um dos curtas. Ao voltar agora, ficou feliz em perceber que hoje não são mais desorganizados e que o MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) é parte da vida institucional brasileira. Outro projeto investiga a razão da vitória do "não" no referendo do desarmamento.
O suíço Vogel, no terceiro ano do curso de cinema, foi escolhido para falar do isolamento dos ricos em São Paulo em um forte processo de seleção. Primeiro, ele pensou em abordar a importância da telenovela ou os nazistas veteranos que hoje moram no Brasil.
Foi quando, em suas pesquisas, descobriu que São Paulo responde pelo segundo maior tráfego aéreo internacional depois de Nova York. Começou a trocar e-mails com Guilherme Haas, 22, estudante da Unisul. Foi Guilherme quem o ajudou a chegar à versão final do tema, o isolamento espacial dos ricos na cidade, acompanhando-o nas filmagens.
Antes de Alphaville, os estudantes visitaram o clube Pinheiros, no Jardim Europa, tradicional reduto de uma seleta elite paulistana que paga até R$ 11 mil para se tornar sócio. O clube, que tem 175 mil m2 de área verde e 24 quadras de tênis, fica encravado ao lado da avenida Brigadeiro Faria Lima.
Nas suas andanças pelo clube, Vogel fez algumas tomadas que revelam o espanto estrangeiro diante das contradições nacionais. Perto de um dos portões, os sócios passeiam em uma área verde tendo o barulho da Faria Lima ao fundo, mas a distância faz com que não se ouça o barulho infernal do trânsito. É mais um dos "aquários" ao qual os brasileiros já se acostumaram, mas que deve surpreender o público alemão quando o resultado final do projeto, com cerca de uma hora, for exibido na TV no ano que vem.


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