São Paulo, sexta, 22 de janeiro de 1999

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Judas vira rock'n'roll

especial para a Folha

Apesar de Bob Dylan e de sua banda de apoio, The Hawks, tocarem com as guitarras plugadas num volume para ensurdecer a platéia do Royal Trade Hall, foi um grito vindo das primeiras fileiras do ginásio que marcou a noite de 17 de maio de 1966.
Ao final de "Ballad of Thin Man", quando a banda se preparava para tocar "Like a Rolling Stone", uma voz masculina soltou "Judas", como resumo de toda insatisfação dos fanáticos ingleses da música folk que haviam desaprovado o set elétrico de Dylan.
"Eu não acredito em vocês, seus mentirosos", retrucou Dylan, virando imediatamente pra banda e pedindo pra tocar "Like..." o mais alto possível. O comportamento da platéia é completamente díspar nos dois momentos do show.
Na parte acústica, tocando clássicos que haviam confirmado Dylan como o grande ídolo folk nos meados da década de 60 nos EUA e no Reino Unido, como "Just Like a Woman" e "Mr. Tambourine Man", o músico americano entrou no palco com o jogo ganho.
Tocando apenas violão e gaita, Dylan discorre seu repertório com tranquilidade. Os aplausos são céticos, talvez porque a platéia já soubesse que novidade e polêmica só viriam após o intervalo, quando o show ficaria rock'n'roll.
"Eu nunca tinha ouvido nada tão apocalíptico. Parecia uma esquadrilha de B-52s (aviões de guerra) dentro de uma catedral", diz Rick Sanders, assistente de produção, sobre o início de "Tell Me Momma", primeira música "elétrica" do concerto. A partir daí, o famoso grito começa a ser gerado.
Mas, traidor ou não, a verdade é que Dylan só virou roqueiro por opção e diversão. Mickey Jones, baterista dos The Hawks, diz: "A postura do Dylan era a seguinte: a primeira parte do show é pra eles, a segunda é nossa".
Apesar da pressão, ninguém da banda estava muito preocupado com as críticas e pedidos de devolução de dinheiro. Logo após que as cadeiras se esvaziaram, Dylan voltou para se divertir tocando Bo Diddley e Little Richard. (DV)



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