São Paulo, quarta-feira, 22 de fevereiro de 2006

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Nasce uma ESTRELA

Favorito ao Oscar de melhor ator, Philip Seymour Hoffman ganha espaço em Hollywood estrelando "Capote", filme de Bennett Miller que estréia na sexta

DAVID EDELSTEIN
DO "NEW YORK TIMES"

Vendo Philip Seymour Hoffman (cabeça grande, corpo grande, vozeirão profundo) encarnar Truman Capote (cabeça pequena, corpo pequeno, voz bizarra e infantil) em "Capote", você sente vontade de lhe dar todos os prêmios de atuação que existem, e quem sabe algumas medalhas olímpicas também. Que concentração! Que troca de formas!
No filme, que estréia no Brasil na sexta, a performance dele transcende a imitação. Com precisão implacável, Hoffman expõe o avesso sombrio da empatia de seu personagem, enquanto Capote explora sua relação com o assassino condenado Perry Smith (Clifton Collins Jr.) para compor seu livro "A Sangue Frio". O que sobra é um retrato lacerante do artista como vampiro, impelido a alimentar-se ao mesmo tempo em que é dominado pela auto-aversão.
Para um ator que não esconde nada na tela, Hoffman, 38 anos, se mostra de modo surpreendente -talvez decepcionante- pouco teatral enquanto almoçamos perto de seu apartamento em Lower Manhattan, onde ele vive com sua namorada e o filho pequeno dos dois. Nada de voz trovejante, nenhuma demonstração de virtuosismo. De pessoas que já trabalharam com ele, ouvem-se comentar duas coisas: a) que ele é um dos atores mais simpáticos e modestos dos tempos atuais; e b) que, nos sets de filmagem, às vezes é impossível chegar perto dele.
"Eu não discordaria disso", disse Hoffmann, tranqüilamente, chegando a estremecer de leve diante da perspectiva de ser retratado como pessoa muito sensível. "Existem certos trabalhos, em determinados ambientes, que não me deixam com tanto medo. Portanto, sou quem sou, e acho que sou uma pessoa bastante decente", afirma.
"Mas, se eu estiver enfrentando dificuldade, se sinto que não estou à altura do desafio, sou incrivelmente exigente comigo mesmo. Quando você está diante de uma câmera, em frente a muitas pessoas, essa é uma posição vulnerável. Às vezes viro uma pessoa de trato difícil. Mas não sou exigente. Sou aquele sujeito que xinga a si mesmo em voz alta."
É estranho ouvir um ator lamentar o fato de que há pessoas olhando para ele, mas existe algo de profundamente privado nos papéis que Hoffmann opta por representar, algo que o consome a fundo. Hoffman primeiro chamou a atenção de críticos e cinéfilos em 1998, na tragicomédia "Felicidade", de Todd Solondz. Ele era o voyeur gordo que telefonava para sua vizinha sensual (Lara Flynn Boyle) e abusava de si mesmo enquanto dizia a ela muitas coisas obscenas.
Nem todas suas atuações levam o espectador a sentir-se tão incomodado quanto essa, mas, desde "Felicidade", Hoffman já encarou alguns papéis bizarros e difíceis: irreverente cantor travesti em "Ninguém É Perfeito" (1999); marido de uma suicida em "Love Liza" (2002); jogador maçante e maníaco em "Incrível Obsessão" (2003); pregador destituído de suas funções e emocionalmente devastado em "Cold Mountain" (2003); e ex-ator mirim grosseiro e hilário em "Quero Ficar com Polly" (2004).


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