São Paulo, domingo, 22 de março de 2009

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BIA ABRAMO

Novela retoma zona de conforto


Nova versão de "Paraíso" volta à tradição da "leveza, custe o que custar"

SERÃO INEVITÁVEIS as comparações entre a nova versão de "Paraíso" e "Pantanal", portanto, a elas, antes de tudo. Mais do que a memória da primeira versão, perdida no início nos anos 80, o que virá à cabeça do espectador será "Pantanal", que mostrou um fôlego incrível quando exibida pela quarta vez no ano passado, no SBT.
Em ambas as novelas de Benedito Ruy Barbosa, há horizontes amplos, pores-do-sol ao som do berrante e cantorias ao pé da fogueira. Há personagens parecidos -nas duas histórias, o todo-poderoso senhor de terras e gado tem origem humilde, é viúvo e se relaciona de modo ambíguo com uma agregada.
Também haverá um movimento contrário de migração -personagens urbanos que vão para a pequena cidade e se encantam com descomplicação (aparente) da vida do interior. Fala-se muito do "cramulhão" (ou cramulhano, como prefere o dicionário Houaiss).
Mas, se no início dos anos 90, quando da primeira exibição da novela, tratava-se de mostrar um mundo que estava fora da teledramaturgia, agora, ao contrário, a ideia é voltar a uma zona de conforto. Na verdade, para duas: a do próprio autor, retomando mais uma vez o mundo rural, e a do horário, insistindo no binômio religiosidade-romantismo.
Aí é que a porca torce o rabo: se em "Pantanal" havia, de alguma forma, o frescor de uma revelação (ou de uma representação ausente, que também pode ser igualmente reveladora), nesta "Paraíso" tudo é nostálgico e antiquado, mesmo aquilo que foi adequadamente atualizado.
O próprio nó da história de amor -a paixão de uma moça considerada santa pelo sujeito que dizem ser filho do Diabo- já se complica de cara. Vinte anos atrás, talvez ainda fosse possível evocar esse catolicismo mais, digamos, folclórico, mas neste século 21, em que a religiosidade popular pendeu para o pragmatismo evangélico, não parece haver muito lugar para beatas, carolas e milagres.
Não se vê mais novela, entretanto, cujo roteiro não tropece nesse tipo de incongruência. Nem sem ter de suportar uma infinidade de diálogos reiterativos, que não levam a lugar nenhum: nos dois primeiros capítulos, a vilã-carola interpretada por Cássia Kiss disse as mesmas quatro ou cinco frases -e só elas- em todos os diálogos nos quais tomou parte.
Mas é justamente isso que se pensa na Globo que o horário exige (ou merece): a leveza, custe o que custar. No pacote, também entram ingenuidade, transporte para um mundo mais pacato e ordenado, conflitos mais cômicos do que dramáticos etc., todos elementos que Benedito Ruy Barbosa parece dominar.

biabramo.tv@uol.com.br


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