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CRÍTICA
Doutrina Bush contamina irmãos Wachowski
SÉRGIO DÁVILA
DA REPORTAGEM LOCAL
É difícil desvincular qualquer produção artística norte-americana feita de 2000 para cá da onda de neoconservadorismo
que assola os EUA desde que
George W. Bush "ganhou" as eleições presidenciais daquele ano.
Há os que incorporam e então
refletem docilmente a nova realidade, caso das comédias de segunda linha "Sou Espião" (o primeiro filme da Doutrina Bush) e
"Encontro de Amor" (que "prova" que nos republicanos também bate um coração).
Há os anticristos, como Michael
Moore e seu "Tiros em Columbine". E havia -pelo menos é o que
se pensava- os que eram maiores do que o seu tempo, como os
irmãos Andy e Larry Wachowski,
dois nerds trintões que mudaram
de novo a ficção científica ao lançarem "Matrix" em 1999.
Infelizmente, também a dupla
se deixou contaminar pelo clima
"ou nós ou eles" que toma o país
do ataque terrorista de 11 de setembro, da guerra do Afeganistão
e da invasão do Iraque. A prova é
"Matrix Reloaded", que estréia
com barulho hoje no Brasil.
Enquanto o primeiro contava a
saga de uma turma de revolucionários que ousava partir para a
guerrilha armada de um jeito tão
romântico que era quase hippie,
esse mostra o mesmo grupo de
pessoas, mas inserido num militarismo totalitarista. O que misturava com sucesso conceitos religiosos, filosofias orientais e uma
pitada transcendental no original,
agora virou puro quebra-pau.
A certa altura, Morpheus (Laurence Fishburne) faz um discurso
para as massas que poderia ter sido dito por Bush a bordo do porta-aviões Abraham Lincoln; além
disso todos o tratam por "sir"; e o
roteiro tem aqueles cacoetes chatos de "Guerra nas Estrelas", com
conselhos e conselheiros.
Só faltou o Jar Jar Binks.
Não dá para deixar de fazer o
paralelo também -tenha sido ele
intencional ou inconsciente por
parte dos diretores- quando o
tal conselheiro-mor fala da diferença entre as máquinas "do
bem", que fazem o serviço sujo
para os humanos, e as máquinas
"do mal", que os querem destruir.
Troque máquinas por imigrantes
e humanos por norte-americanos, e eis um retrato do atual estado das coisas nos EUA.
Assim, é natural que o que mais
se destaca agora seja a evolução
técnica, realmente impressionante, principalmente na cena em
que Neo (Keanu Reeves) luta com
dezenas de Agentes Smith e na já
tão falada rodovia, em que acontece a perseguição principal.
(Mesmo aqui, cabe um parênteses desconfiado: a maior parte
dessas cenas foi atuada por simulações digitais de atores, e não atores em si, assim como a câmera
que as filmou não era sempre
uma câmera, mas outra simulação digital. É mesmo arte ou "Matrix" virou uma matriz?)
Pela revolução tecnológica (e é o
caso mesmo de usar a palavra "revolução"), "Matrix Reloaded"
mereceria avaliação máxima; pela
história, a mínima.
Fica então com duas estrelas.
Matrix Reloaded
The Matrix Reloaded
Direção: Andy e Larry Wachowski
Produção: EUA, 2003
Com: Keanu Reeves, Laurence
Fishburne, Carrie-Anne Moss
Quando: a partir de hoje, no Eldorado 5,
Ibirapuera 1 e circuito
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