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29ª MOSTRA DE CINEMA
Diretor de "A Eternidade e um Dia" mostra visão nada turística do país mediterrâneo ao construir um drama histórico
Angelopoulos exibe Grécia crepuscular
JOSÉ GERALDO COUTO
COLUNISTA DA FOLHA
Depois de conquistar admiradores e detratores pelo
mundo afora com a fantasia um
tanto aparatosa de filmes como
"Paisagem na Neblina" (1988), "O
Olhar de Ulisses" (1995) e "A Eternidade e um Dia" (vencedor da
Palma de Ouro em Cannes em
1998), o grego Theo Angelopoulos
volta à Mostra de São Paulo com
um melodrama histórico, "Trilogy: The Weeping Meadow", de
2003.
O longa poderia ser descrito como uma espécie de "1900" grego,
em que a conturbada história do
país na primeira metade do século 20 é narrada da perspectiva de
uma família de gregos fugidos de
Odessa, na Ucrânia, depois da Revolução Russa e instalados em
Tessalônica, na Grécia.
Em lugar do esplendor solar de
Bertolucci, porém, trata-se aqui
de um drama sombrio, crepuscular, ambientado em paisagens devastadas e povoado de seres sem
esperança.
Eleni, menina cujos pais foram
mortos pelo Exército Vermelho, é
adotada por uma família de gregos que retornam à sua terra. O
chefe da família, Spyros, ao ficar
viúvo, casa-se com a garota, agora
adolescente, mas esta foge com o
irmão de criação, Alexis, com
quem tem dois filhos.
O drama se concentra então no
jovem casal, que foge da perseguição do pai/noivo traído, ao mesmo tempo em que vê o país afundar no desemprego, na miséria,
no fascismo e, finalmente, na
guerra.
Alexis, exímio acordeonista,
junta-se a um grupo de músicos
mambembes que busca resistir
com sua arte aos tempos difíceis,
o que permite a Angelopoulos colocar em prática o seu lirismo algo
felliniano, que consiste na busca
da beleza entre os escombros e a
desolação.
Água e fogo
Em alguns momentos essa busca é feliz, como no funeral fluvial
do pai de Alexis, com um punhado de canoas iluminadas e seus
reflexos na água escura, ou na cena da inundação da cidade, transformada num rascunho involuntário de Veneza.
Por vezes, porém, o artificialismo sufoca a poesia, como na seqüência em que os músicos surgem tocando, um a um, entre lençóis estendidos ao vento.
A despeito desses deslizes
-pouco numerosos, em comparação com outras obras do diretor-, o filme é de uma beleza inegável, com sua imagem predominantemente noturna e sem cor,
em que a água, sob todas as suas
formas, exerce uma função central. Nesse mundo cinzento e
úmido, o fogo, quando aparece,
vê realçado o seu papel de fonte de
luz e calor.
A exposição do espaço e dos
personagens, geralmente em longos planos quase fixos, faz lembrar as gravuras belas e terríveis
de Kate Kollwitz e outros artistas
do período entre-guerras.
A visão da Grécia que o filme
nos comunica é a mais distante
possível do paraíso mediterrâneo
a que o cinema e o turismo nos
habituaram: é uma terra inóspita
e lúgubre de onde os moradores
querem fugir a todo custo, se possível para a América.
Trilogia - O Vale dos Lamentos
Direção: Theo Angelopoulos
Quando: hoje, às 15h, no Frei Caneca
Unibanco Arteplex; amanhã, às 19h20,
no Cinesesc; e dias 24, às 15h, na Faap; e
27, às 17h20, no Reserva Cultural
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