Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
"Novela da Globo lança vírus ideológico"
Dono da Band, João Carlos Saad alfineta a concorrente e explica por que decidiu voltar a investir em teledramaturgia
"Paixões Proibidas", uma produção de época com Felipe Camargo, vai ao ar
às 22h, na Bandeirantes, a partir do próximo mês
LAURA MATTOS
DA REPORTAGEM LOCAL
Depois da Record, agora é a
Band que corre atrás da Globo e
tenta emplacar como produtora -e exportadora- de novelas. "Paixões Proibidas" estréia
no próximo mês, com Felipe
Camargo, Graziella Moretto e
alguns outros poucos globais.
De época, é co-produzida pela RTP, emissora pública de
Portugal, e deverá ser veiculada
simultaneamente nos dois países. Por isso, o elenco traz astros da TV portuguesa.
A história é baseada em três
romances do escritor português Camilo Castelo Branco
(1825-1890), com roteiro de Aimar Labaki e direção de Ignácio Coqueiro, que já atuaram na
teledramaturgia da Globo.
Dono da Band, João Carlos
Saad fala à Folha sobre o investimento em teledramaturgia e
alfineta a Globo com uma tese
inusitada: a de que suas novelas
disseminam internacionalmente "determinados vírus
ideológicos". A Globo não quis
comentar. A seguir, Saad explica essa e outras teorias.
FOLHA - Por que fazer novela?
JOÃO CARLOS SAAD - Por acreditar que é um gênero importante na cultura latina. Uma emissora latina tem de ter novela.
FOLHA - Além da dificuldade financeira, um outro motivo levou a Band
a abandonar novelas por anos?
SAAD - A parada não foi só na
produção de novela, mas em
tudo. Não há programação que
resista à quantidade de esportes que exibíamos. Transmitíamos todos os eventos esportivos que comprávamos. Arrebentamos com a programação,
não havia como acertá-la diante de tantas mudanças de horários dos jogos. Hoje, se tivéssemos regras corretas, detentores de direitos esportivos teriam de exibir o que compram.
É injusto e incorreto comprar
eventos esportivos e não exibir.
FOLHA - A parceria da Band com a
RTP reflete a demanda por novelas
locais e não "enlatadas" brasileiras.
Por isso a Globo perdeu espaço?
SAAD - A [rede portuguesa]
TVI [concorrente da SIC, que
exibe novelas da Globo] foi ao
primeiro lugar em razão disso.
FOLHA - Em resposta a essa tendência, que parece mundial, a Globo
montou um novo modelo de negócio, no qual tentará exportar não só
a novela pronta, mas seu formato,
para que seja produzida uma nova
versão em cada país. O que acha?
SAAD - Já ouvi de países vizinhos problemas com a novela
brasileira, seja em razão do excesso de "tempero", seja de determinados vírus ideológicos.
FOLHA - Que vírus ideológico?
SAAD - Vários. Pega o "Rei do
Gado" [1996/97]. O que foi glamourizado? O que saiu do noticiário e entrou na dramaturgia?
O MST [Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra].
Lembra que o [senador petista
Eduardo] Suplicy entrou na novela? Procure ver aonde foi a
novela [a mais de 30 países, entre eles Cuba e Argentina]. Vi
muito país dizer "Não quero". A
TV aberta no mundo é muito
conservadora. Só não é aqui [no
Brasil], onde você vê muito tema com o qual se incomoda por
estar com seu filho na sala. Se é
menina, então, fica mais grilado. Mas com menino também.
FOLHA - Já foi publicado é que a novela da Band será "apimentada".
SAAD - Tem que perguntar ao
autor e ao diretor. O horário de
exibição [22h] até permite.
FOLHA - As novelas da Globo, e
agora isso chegou à Record, passaram a abrir um espaço para debater
o preconceito em torno dos gays...
SAAD - [interrompendo] Se
olhar o tratamento dado ao tema lá fora, verá que o nosso é
muito mais [procura a palavra]... liberal. "Escrava Isaura",
que foi um baita sucesso mundial, é clássica e conservadora.
FOLHA - Por isso a Bandeirantes
optou por uma novela de época?
SAAD - A escolha foi em torno
de um grande escritor. E novela
de época não tem merchandising, mas é atemporal. É bom
para exportação, reexibição.
FOLHA - Por que a Band, assim como a Record, é paulistana mas levou
a produção da novela para o Rio?
SAAD - O governo de SP ainda
não sabe o que é essa indústria,
não a olhou estrategicamente.
O do Rio, que sabe a importância dessa indústria para geração
de impostos, empregos, marketing, é bem mais ágil. A vantagem vai desde custo de estúdio
até liberação de ruas para gravações, menos impostos.
FOLHA - Mudando de assunto, o
que achou do debate da Band?
SAAD - Como empresário de
TV, fiquei feliz. Como brasileiro, triste e preocupado, porque
muita gente não assistiu. Apesar de a audiência ter sido grande para nós, 70% dos brasileiros não viram. Há alienação.
FOLHA - Quem ganhou o debate?
SAAD - A pesquisa dá essa resposta. Para as camadas mais
humildes, o formato agressivo
do Alckmin não funcionou.
FOLHA - O que achou de o "Jornal
Nacional" (Globo) ignorar o debate?
SAAD - Lamentável.
FOLHA - Por último: telejornais da
Band fizeram reportagens sobre supostas irregularidades do SBT quando a TV Alphaville, de Silvio Santos,
trocou a Bandnews pela Globonews. Isso não é submeter o jornalismo a interesses comerciais?
SAAD - [pausa] Precisa voltar à
época [1º semestre], se não embola tudo e confunde. São coisas separadas que podem estar
próximas. Acho que não tem a
ver, pode ter sido coincidência.
FOLHA - E, para você me expulsar
[risos]: vai renovar contrato com o
pastor RR Soares [que paga para
ocupar o horário nobre da Band]?
SAAD - Pensei: "ela arrasta
uma asa por ele, não vai deixar
de perguntar" [risos]. Não sei.
Texto Anterior: Enredo busca as origens do idioma Próximo Texto: Saad defende que o governo utilize BNDES para financiar telenovelas Índice
|