São Paulo, domingo, 22 de outubro de 2006

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BIA ABRAMO

A propaganda política e seu duplo


Por mais positividade que se tente imprimir aos filmes, a impressão é de uma luta exaustiva

AGORA, ACABOU o folclore. Ao contrário do primeiro turno, quando as exigüidades de tempo, de domínio da linguagem televisiva e de idéias produzem aberrações hilariantes, a propaganda eleitoral gratuita no segundo turno é um ringue de batalha.
Bem postados, bem vestidos, bem retocados, os candidatos fazem um confronto imagem a imagem, palavra a palavra, cada uma delas milimetricamente ensaiadas, testadas, calculadas.
Por mais positividade que se tente imprimir ao tom dos filmes -e como se tenta!- a impressão que resta do horário político é a de uma luta exaustiva.
O curioso é que se obtém a vitória ou a derrota, a adesão a esta ou àquela proposta e aqui, frise-se, estamos examinando os recursos de linguagem e estilo, por meio de uma operação em que, mesmo com sentimentos edulcorados, maquiados e embalados para o consumo fácil e imediato, a agressividade própria da briga política acaba por se impor.
Uns meses atrás, o programa "Casseta e Planeta" fez uma paródia genial de propagandas "oficiais", de empresas públicas e mesmo de privadas, que se utilizam do recurso da "musiquinha".
Em geral, junta-se um pout-pourri de imagens de uma brasilidade feliz, sorridente, popular, de representação transregional, transclassista (desde que, é claro, os pobres que pareçam tenha todos os dentes bem brancos), transetária a uma "musiquinha" tresandando a "Brasil". É uma das fórmulas mais eficientes de conferir uma pátina de alegria e otimismo à ideia de nação, fazendo o espectador se render aos encantos e às graças dessa abstração chamada "povo".
Pois bem, é esse "povo", feliz e lindo, capaz de tantas manifestações de beleza inconteste, que está sendo disputado, palmo a palmo, consciência a consciência, escolha a escolha.
Daí, o aviso: essa imagem de felicidade, realização e pujança cultural só se realiza se um e apenas um daqueles que se candidatam a chefe da nação se elege, pois caso seja o outro, é o negativo daquilo que é sugerido pela "musiquinha" que teremos como perspectiva.
Se funciona? É claro que sim, mas a questão é: a que custo? Sabemos de um parte desse custo já desde as primeiras eleições diretas pós-regime militar, mas a evolução das técnicas de propaganda política sugerem que o estrago pode ser bem mais permanente e maior.


biabramo.tv@uol.com.br

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