São Paulo, quinta-feira, 22 de novembro de 2001

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"QUANDO AS MÁQUINAS PARAM"

Espetáculo traz ao palco realidade insuperada

KIL ABREU
CRÍTICO DA FOLHA

Talvez não haja no repertório do dramaturgo Plínio Marcos um tema tão apropriado aos dias atuais quanto este de "Quando as Máquinas Param". A história do casal enredado na falência financeira e no fracasso provocado pelo desemprego reencontra, 30 anos depois da criação do texto, o perverso eco histórico que atualiza a fábula e espelha com urgência dramática a realidade ainda insuperada.
O que garante o terrível frescor da obra é a denúncia da alienação quase animal de seus personagens, e isso sem que haja no texto, a rigor, uma discussão política da miséria, ao menos não em seu primeiro plano.
Zé (Edmilson Cordeiro) e Nina (Cássia Goulart) polarizam um procedimento importante na fase criativa mais profícua de Plínio: o interesse em investigar os limites existenciais de seres distanciados de qualquer possibilidade de inserção, que não encontram o espaço em que se possam reconhecer para além do papel de objetos no jogo social.
E, se não encontram reconhecimento no coletivo, pouco reconhecem a si mesmos. O Zé da história iguala a mulher ao time de futebol, uma mesma e indiferenciada paixão, e prefere matar a ver-se sustentado pela sogra. Dividida entre os apelos cotidianos e o acanhado imaginário habitado por galãs e concursos de miss, Nina mostra ser capaz, no entanto, de pensar soluções práticas e de projetar sua imagem de classe.
O conflito tende a se constituir, então, na arena aberta entre essa fala rude, incapaz de interpelar a si mesma, e o discurso pré-consciente, articulado pela mulher, que dá argumentos para uma luta que avança da virulência verbal para a ameaça física.
A montagem dirigida por Joaquim Goulart pouco contorna as dificuldades que o texto oferece e contenta-se em fazer um depoimento cênico que reforça as tintas da dramaticidade, mas não investiga o meio-tom entre uma e outra sequência da ação.
O texto de Plínio Marcos centraliza sua força em um mesmo mote, dado nos primeiros minutos da peça, mas acrescenta a ele variações que veremos transformadas no decorrer da narrativa em importantes elementos de intensificação.
Ao eleger uma dinâmica que tenta flagrar o clima claustrofóbico do conflito, o diretor mostra pouco interesse em explorar esse crescimento e coloca a cena já desde o início em sua temperatura máxima, alimentada sobretudo pelo "over acting" de Edmilson Cordeiro. Alguma compensação acontece nas intervenções de Cássia Goulart, que não tem pressa na revelação de sua personagem e é responsável pelos melhores momentos do espetáculo.
Chapada em um alto volume e na gestualidade excessiva, a encenação perturba menos pelo significado do drama que pela tentativa permanente, mas nem sempre frutífera, de convencimento da platéia.


Quando as Máquinas Param
  
Texto: Plínio Marcos
Direção: Joaquim Goulart
Com: Edmilson Cordeiro e Cássia Goulart
Onde: teatro Augusta - sala experimental (r. Augusta, 943, tel. 0/xx/ 11/3151-4141)
Quando: sex., às 21h30; sáb., às 22h30, e dom., às 19h; até 16/12
Quanto: de R$ 10 a R$ 15




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