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DOCUMENTÁRIO
Curta compara escravidão de ontem e de hoje
XICO SÁ
CRITICO DA FOLHA
O curta-metragem de
Fernando Mozart é narrado
a partir do artigo "Notícia do Brasil", escrito em 1829 pelo capelão e
cronista inglês Robert Walsh, que
conta os horrores vividos em um
navio negreiro. Juntam-se ao texto animações com personagens
da gravura "Negros no Porão", de
Rugendas (1802-1858).
Com depoimentos de ex-traficantes, um policial, um empresário, uma secretária e outros seres
amedrontados pelo terror urbano
de agora, o filme constrói uma
comparação entre os porões da
escravidão e os caldeirões suburbanos das metrópoles.
Aos entrevistados foram exibidos a crônica de Walsh e a gravura, como uma forma de motivá-los para falar sobre as situações de
ontem e de hoje. A intenção era
provocar boas vozes, mas o resultado saiu muito certinho, esquemático, como em uma reportagem para a TV na qual o repórter
força até obter a frase "perfeita".
A grande arte de um documentarista, nos sopra Eduardo Coutinho, é saber ouvir. Por mais que
exista uma tese e uma mínima
moral manipuladora, não custa
nada deixar falar, fabular a gosto,
como queria o Esopo do cinema-verdade Jean Roch, morto na semana passada. Premiado pela
Riofilme e pelo Canal Brasil, que o
exibe nesta semana, "Porão" fica a
dever apenas uma maior generosidade, uma certa etnografia afetiva, o que daria ao seu paralelo entre as escravidões de ontem e de
hoje maior consistência.
Da forma que foram colhidos os
depoimentos, as falas caíram em
um marxismo miúdo, sempre a
mostrar a miséria como origem
de todos os males. Até mesmo os
negócios milionários do tráfico.
A boa idéia de usar a crônica do
viajante inglês, que conduz a narrativa, e as imagens de opressão
de Rugendas animado, fazem valer a pena ver o filme. Outro bom
momento é a bicicleta, em animação, a partir de uma foto clássica
de Pelé. Melhora as falas dos entrevistados sobre o sonho de ser
um jogador de futebol como contraponto à vida miserável.
Porão
Quando: sexta, às 22h50, no Canal Brasil
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