|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Música - Crítica/pop
Mika cria "mundo de ilusão" e acerta em suas ambições
THIAGO NEY
DA REPORTAGEM LOCAL
Todo disco que é capaz
de inspirar paixões
opostas, que faz o ouvinte amá-lo ou odiá-lo, merece
atenção especial. Essa é a maior
qualidade de "Life in Cartoon
Motion", álbum de estréia do
cantor libanês Mika, a principal
revelação pop do ano.
Nascido em Beirute, no Líbano, Mika Penniman, 23, chama
a atenção à primeira audição
por duas características: a voz
em falsete, extensa, resultado
de sua experiência em canto lírico; e o piano, de onde ele tira
melodias que remetem à disco
music dos anos 70 -tudo muito dançante e... excêntrico.
Com essa receita, aparecem
as comparações. A primeira
lembrança é Freddie Mercury,
o vocalista do Queen, morto em
1991. Com sua obsessão por elaborar uma música orquestrada,
de clima suntuoso, o cantor se
aproxima também de Elton
John, Prince e do grupo norte-americano Scissor Sisters.
Em entrevista à Folha, Mika
contou que sua intenção é criar
um "mundo de ilusão", música
ao mesmo tempo pop e diversa.
A diversidade que aparece
em "Life in Cartoon Motion"
ganha eco na própria vida de
Mika. Com apenas pouco mais
de um ano, devido aos conflitos
no Líbano, sua família foi morar em Paris. Na adolescência,
ele estabeleceu-se em Londres,
onde estudou música e estreou
no palco numa obra de Strauss
na Royal Opera House.
No final do ano passado, Mika começou a ser realmente
notado, quando a maior rádio
britânica, a estatal Radio 1, começou a tocar a pegajosa "Grace Kelly". Lançada como single,
desde 21 de janeiro a canção está no topo da parada britânica.
Já o disco, "Life in Cartoon
Motion", que saiu no Reino
Unido no último dia 5 e chega
ao Brasil no início de março,
também foi direto ao primeiro
lugar da lista dos mais vendidos -e ainda permanece lá em
cima. Ou seja, Mika domina a
parada de single e de discos daquele país.
Ame-o ou deixe-o
Se comercialmente o libanês
é um sucesso, as críticas recebidas são extremas. Jornais como
o "Guardian" e o "Independent" execraram o disco; já o
"Telegraph", o "Evening Standard" e o "Observer" levantaram muito a bola do álbum.
A questão central é que quando Mika acerta, produz jóias irreparáveis; mas, quando erra a
mão, suas canções tornam-se
bem irritantes.
Neste último caso entram
principalmente as baladas açucaradas muito acima do ponto,
como "Happy Ending", "Any
Other World" e "My Interpretation". Letras sentimentalóides, melodias bobas -de acabar com o dia de qualquer um.
Mas a luz vem com o resto do
disco. "Grace Kelly", em que
Mika faz referências a Freddie
Mercury e aos tempos em que
rodava de gravadora em gravadora atrás de um contrato, é a
"Crazy" deste ano -"Crazy" é a
canção do Gnarls Barkley que
reinventou o pop ao jogar bases
eletro-psicodélicas em cima de
um vocal soul.
(Curiosidade: "Crazy" fez
história em 2006 ao tornar-se a
primeira canção a chegar ao
primeiro lugar da parada britânica apenas com as vendas por
download; "Grace Kelly" foi a
segunda a conseguir tal feito.)
Com harmonias bem calibradas ao piano, "Love Today" e
"Billy Brown" são quase tão infecciosas como "Grace Kelly".
"Relax, Take it Easy" faz clara
reverência aos Bee Gees, enquanto "Stuck in the Middle",
lembra uma balada alegre do
Scissor Sisters -ou, melhor,
lembra uma balada alegre de
Elton John.
Com todas as suas referências aos anos 70, Mika consegue achar um espaço autoral na
música de hoje ao trazer de volta uma figura que andava em
falta: a do grande cantor pop de
qualidade, com postura grandiosa e ambiciosa -como Prince, Michael Jackson e o próprio
Elton John costumavam ser.
LIFE IN CARTOON MOTION
Artista: Mika
Lançamento: Universal (no Brasil, a partir do início de março)
Quanto: R$ 35, em média
Texto Anterior: CDs Próximo Texto: Cantor faz Brian May brigar com jornalistas Índice
|