São Paulo, segunda, 23 de fevereiro de 1998

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TELEVISÃO
Opinião dividida dos americanos vai ao ar na CNN

ESTHER HAMBURGER
especial para a Folha em Austin

A opinião pública existe. É ela que dita trajetórias inusitadas à sequência de eventos midiáticos que assola o país das comunicações eletrônicas. É ela também que, em parte, mantém em suspenso o desfecho de cada um deles.
Entre guerras nas distantes terras de Aladim e escândalos amorosos do presidente no salão oval da Casa Branca, a opinião pública flutua de acordo com seus próprios critérios imponderáveis.
Há alguns dias poderia se supor que a marcha para a guerra seria consensual nos EUA. Os republicanos já haviam manifestado sua usual vontade bélica. Os democratas preparavam uma campanha de divulgação da decisão do presidente. Os políticos estavam de acordo com o ataque.
Mas o que não estava previsto é que a opinião pública americana se manifestasse contra o confronto de maneira contundente. Para quem testemunhou o bombardeio de Bagdá servir de tema à espetáculos de fogos de artifício que comemoram a independência a cada 4 de julho, é surpreendente que os cidadãos da única potência mundial que sobreviveu à queda do muro de Berlim tenham se mostrado razoáveis. Mais que razoáveis, às vezes até humildes.
Tanta certeza se tinha do apoio popular que o governo programou sessões de esclarecimento ao público que deveriam fazer soar o grito de guerra de uma nação unida.
O governo negociou com a direção da CNN a transmissão direta dos debates em todas as partes do mundo atingidas pelo canal.
Depois que os cidadãos de Ohio aproveitaram a audiência global para expressar seu ceticismo, não atendendo ao chamado dos tambores e questionando os princípios básicos da cartilha de Madeleine Albright, a secretária da Defesa, o debate televisivo em si virou assunto. Terá Saddam Hussein em pessoa se deleitado com o espetáculo de fragilidade interna oferecido pelo inimigo via satélite?
No caso Mônica Lewinsky, a saturação da opinião pública com o excesso da cobertura, expressada em cartas e e-mails do leitor, nas pesquisas e na opinião de jornalistas liberais, sinalizou às emissoras de TV que talvez elas estivessem indo longe demais na exposição da privacidade do presidente.
No caso da guerra, o meio televisivo serve aos cidadãos que desejam manifestar seu descolamento, dessa vez de uma política de Estado. Nos dois casos a TV demonstra uma vocação indiscreta capaz de provocar respeitáveis reações inesperadas, que de alguma forma passam a ser minimamente contempladas.


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