SÉRGIO RIZZO
CRÍTICO DA FOLHA

No universo simbólico criado pelo cinema, o tema da vingança povoa especialmente o faroeste e o policial. O sul-coreano Chan-wook Park requenta ingredientes dessas tradições, aplicadas ao mundo cão contemporâneo, na trilogia que chegou ao Brasil com o lançamento nos cinemas do episódio intermediário, "Oldboy" (2003). Depois, veio o último capítulo, "Lady Vingança" (2005).
O longa inaugural, "Mr. Vingança" (2002), só agora é lançado no Brasil, em DVD (junto com "Lady Vingança"). Assistir à trilogia na ordem correta permite observar que a familiaridade entre as histórias obedece a um crescendo de tensão e violência, com abordagens distintas, ainda que de apuro estético semelhante.
Há menos pirotecnias visuais e maior cuidado com o vagaroso desenvolvimento da trama em "Mr. Vingança", que embute duas histórias em uma. Na primeira, um metalúrgico surdo-mudo faz o que não deve para tentar salvar a irmã, à espera de um transplante de rim.
A comédia macabra de erros que suas ações desencadeiam leva à segunda história e lembra as situações insólitas, as elipses narrativas e o predomínio do vermelho (de sangue) que reaparecem nos filmes seguintes. O resultado, no entanto, é bem menos vertiginoso.
Provocar tensão no espectador ainda não era prioritário e havia espaço até para ironias políticas. Slogans como "não compre produtos americanos" encontram um modo natural de se inserir e ajudam a entender o quebra-cabeça.
Em "Lady Vingança", tudo é mais sangüíneo e espetacular: diante de crimes horrendos contra crianças, qual a reação possível? Enquanto os personagens tomam suas decisões e executam o acerto de contas, o filme põe o espectador na parede, como se esperasse dele alguma espécie de solidariedade a quem responde à barbárie com mais barbárie.