TIAGO MATA MACHADO
CRITICO DA FOLHA

Em entrevista ao jornal argentino "La Nación", a propósito do lançamento de "A Comunidade", o diretor basco Alex de la Iglesia contrapunha a sua concepção de cinema ao realismo "triste" e "dogmático" de um Eric Rohmer. Para De la Iglesia, um cineasta deve ter imaginação.
Não é de surpreender que o jovem cineasta espanhol pegue Rohmer, um alvo fácil da crítica apressada, para cristo. Difícil de compreender é o que De la Iglesia entende por "imaginação". A julgar por "A Comunidade", espécie de pastiche paródico de clássicos do suspense, a "imaginação" do diretor não difere muito da dos mais plagiários publicitários.
De la Iglesia não consegue conceber nem uma cena sem apelar para a imaginação dos outros -especialmente, no caso, a de Hitchcock em "Um Corpo que Cai" e "Janela Indiscreta" e a de Polanski em "O Bebê de Rosemary" e "O Inquilino".
Já nos letreiros, a proposta de "A Comunidade" se evidencia: o design gráfico, lembrando a clássica criação de Saul Bass para "Um Corpo que Cai", e a trilha sonora, ecoando os acordes de Bernard Herrmann, nos preparam para uma paródia de Hitchcock.
Hoje essas paródias do mestre se (re)produzem, mas é bom lembrar que os originais eram considerados meros enlatados hollywoodianos quando Rohmer e sua turma começaram, nos anos 50, a celebrar o realismo espiritual de Hitchcock. Ele está em muitas cenas de "A Comunidade", mas o filme é dos que apelam para tudo.
Uma sequência, por exemplo, começa com uma cena de perseguição pelos telhados que seria uma citação de "Um Corpo que Cai", se não se revelasse a citação da citação de "Matrix", e acaba como em tantos finais clássicos hitchcockianos.
Pior do que o tom paródico é o humor juvenil. "A Comunidade" parece o filme de um eterno adolescente dos anos 80. Seu personagem-chave é um nerd voyeur e abobalhado que, embora ficando careca, continua a jogar fliperama e a se fantasiar de Darth Vader.

A Comunidade
La Comunidad  
Produção: Espanha, 2000
Direção: Alex de la Iglesia
Com: Carmen Maura, Eduardo Antuña, María Asquerino, Jesús Bonilla Quando: a partir de hoje, no Espaço Unibanco 1